Na ação ajuizada perante a Vara do Trabalho de Guanhães, uma ex-empregada denunciou a prática de dispensa discriminatória decorrente do seu problema de saúde. A trabalhadora ficou afastada de suas atividades para tratamento médico de um câncer de mama. Mas, assim que retornou ao trabalho, perdeu o emprego, já que a empresa de engenharia suspeitou de uma metástase da doença. Com a saúde debilitada, a trabalhadora se viu desamparada e desempregada no momento em que mais precisava de apoio financeiro. Diante dessa constatação, a juíza Verena Sapucaia Silveira Gonzalez condenou a empresa ao pagamento de uma indenização por danos morais no valor de 10 mil reais.
Inicialmente, a magistrada explicou a diferença entre os termos: “discriminação direta e indireta”. No primeiro caso, ela pontuou que existe a intenção do agressor – consciente dos efeitos e do alcance da sua conduta – no sentido de afetar um indivíduo ou um determinado grupo profissional, dificultando ou impedindo o exercício de suas atividades. Já no caso da discriminação indireta, ela esclareceu que a prática decorre de políticas adotadas pela empresa, cujos contornos acabam se transformando em obstáculo para o acesso ou a permanência de determinadas pessoas ou segmentos profissionais no emprego.
Em sua sentença, lembrou a juíza que o Brasil ratificou a Convenção nº 111 da OIT (Decreto nº 62.150/1968), que, em seu artigo 1º, define como discriminação “Toda distinção, exclusão ou preferência fundada na raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social, que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão”. A julgadora citou ainda a Lei nº 9.029/1995, aplicada ao caso, que proíbe a adoção de medidas que visem a constranger o trabalhador, limitando o seu acesso ao emprego, a partir da consideração de fatores externos relacionados à expressão da sua personalidade. “A legislação brasileira não exige a intenção no agir, o que significa que mesmo as condutas de discriminação indireta são vedadas pelo ordenamento jurídico”, acrescentou a magistrada, lembrando também o entendimento do TST, sintetizado na Súmula 443, que considera discriminatória a dispensa do empregado portador de doença grave que suscite estigma ou preconceito.
Entretanto, conforme alertou a julgadora, a simples existência de uma doença grave não é suficiente para se presumir a ocorrência de dispensa discriminatória. Como se trata de presunção, ela enfatizou a necessidade da produção de provas por parte da empresa: “A despedida discriminatória pode ser afastada por prova em sentido contrário, cabendo ao empregador demonstrar que o ato da dispensa se deu em desconhecimento do estado do empregado ou que decorreu de outra motivação lícita que não a sua condição de saúde”. Mas, de acordo com a avaliação da magistrada, a empresa de engenharia não conseguiu produzir as provas necessárias e, além disso, existiam elementos no processo desfavoráveis à tese patronal de legalidade da dispensa.
Ao examinar os documentos juntados ao processo, a julgadora verificou que a ex-empregada foi acometida por doença grave (câncer de mama), tendo se submetido a cirurgia conservadora da mama e a tratamentos de radioterapia, ficando afastada de suas atividades com recebimento de auxílio-doença por cerca de dois anos. Após o término do benefício, o INSS indeferiu o pedido de prorrogação do auxílio-doença, mas o médico da empresa, na ocasião do exame de retorno, encaminhou a trabalhadora novamente ao Órgão Previdenciário, por entender que ela não se encontrava apta para o trabalho.
A juíza observou que os documentos atestam suspeita de neoplasia endometrial secundária, com grande possibilidade de a trabalhadora ser submetida à retirada do útero e seus anexos. Para a magistrada, ficou claro que a empresa tinha conhecimento do longo período de afastamento da empregada para tratamento de saúde e do fato de que a autora ainda se encontrava em tratamento, inclusive diante de possível novo afastamento em razão dos novos problemas de saúde. Conforme reiterou a juíza, a trabalhadora encontrava-se em situação que suscitava discriminação, pois foi acometida por doença, notoriamente grave e que proporciona debilidade física da adoentada, o que acarretou a necessidade de afastamento por cerca de dois anos e, quando retornou ao trabalho, ainda se encontrava em tratamento, inclusive na iminência de se submeter a nova cirurgia, o que, por certo, demandaria novo afastamento.
Reforçou a convicção da magistrada o fato de a empresa não ter apresentado qualquer razão plausível para justificar a dispensa da trabalhadora, limitando-se a alegar que a dispensa é legítima, regular e decorreu do regular exercício do poder diretivo do empregador. “Trata-se de dano presumível, sendo desnecessárias maiores provas. (…) E uma vez constatada a existência dos elementos da responsabilidade civil, ensejadores da obrigação de reparação, devida a indenização por danos morais decorrentes da dispensa ilícita”, finalizou a julgadora. A empresa apresentou recurso, que ainda aguarda julgamento no TRT mineiro.
Fonte: TRT 3