É abusiva a demissão em massa sem prévia negociação coletiva e a inadimplência das verbas rescisórias dos trabalhadores demitidos viola o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Com base nesse entendimento, a Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região – AM/RR (TRT11) condenou a empresa Air Tiger do Brasil Ltda. a pagar R$ 2 mil de indenização por danos morais a cada um dos funcionários dispensados em massa no ano de 2013, além de R$ 100 mil por danos morais coletivos que serão revertidos ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
O colegiado acompanhou por unanimidade o voto da desembargadora relatora Ruth Barbosa Sampaio, que deu provimento em parte ao recurso do Ministério Público do Trabalho (MPT) para julgar procedentes os dois pedidos indenizatórios indeferidos na primeira instância.
Ao narrar os fatos que deram origem à ação civil pública em análise, bem como a tentativa frustrada de solucionar a questão no âmbito extrajudicial, ela explicou que o MPT também propôs a Ação Cautelar nº 0011928-48.2013.5.11.0005, no bojo da qual foi determinado liminarmente o bloqueio de valores existentes na conta bancária da ré, a indisponibilidade de seus bens, e, subsidiariamente, dos valores e bens em nome de seus sócios. Entretanto, foi efetivada somente a restrição judicial de nove veículos de titularidade da empresa.
Na sessão de julgamento, a relatora apresentou considerações sobre a responsabilidade decorrente do dano moral que emerge da violação a direitos gerais de personalidade, fundamentando seu posicionamento no artigo 5º, incisos V e X, da Constituição Federal e artigo 186 do Código Civil. Ela acrescentou que o dano moral abrange todo atentado à intimidade, à segurança, à tranquilidade, à integridade, dentre outros, que não estejam enquadrados na definição de dano material. “No caso, é bem razoável se presumir que os trabalhadores afetados passaram por terríveis dificuldades de toda ordem, no âmbito pessoal, familiar e social”, observou.
As indenizações por danos morais deferidas na segunda instância ainda são passíveis de recurso. Entretanto, a condenação de origem quanto ao pagamento das verbas rescisórias e multas já transitou em julgado, ou seja, não pode mais ser modificada porque a reclamada não recorreu.
Impacto social
Em análise minuciosa das provas, a desembargadora Ruth Sampaio ressaltou que ficaram comprovados nos autos o encerramento das atividades da Air Tiger em Manaus (AM) e a dispensa coletiva a partir de outubro de 2013, sem quitação dos valores a que os trabalhadores têm direito, bem como a retomada de suas atividades em São Paulo a partir de janeiro de 2014.
De acordo com a relatora, a empresa sequer impugnou os fatos relatados na ação civil pública, limitando-se a destacar em sua defesa escrita a grave situação financeira em que se encontra e argumentar que “vem tentando de todas as formas” reduzir os danos oriundos do descumprimento de suas obrigações por meio da liberação dos documentos para saque do FGTS e habilitação ao seguro-desemprego. “Destaco, ainda, que houve, no presente caso, evidente demissão em massa abusiva, ante a ausência de prévia negociação coletiva com o sindicato da categoria, medida que se mostrava indispensável tendo em vista a necessidade de mitigar os efeitos dessas demissões, de inegável impacto social”, argumentou.
Quanto ao dano material coletivo, a relatora salientou que não se confunde com a mera ilegalidade, sendo necessária a demonstração de alguma consequência negativa para a sociedade. Nessa linha da raciocínio, ela entendeu que a empresa afrontou os “mais basilares princípios constitucionais e trabalhistas” por não pagar as verbas rescisórias de 46 funcionários, causando prejuízos na esfera coletiva que invocam a necessária reparação.
Ao fixar os valores indenizatórios, ela explicou que foram observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. tomando por base o porte econômico do ofensor, as condições em que se deu a ofensa e o caráter pedagógico da reparação, dentre outros elementos.
Origem da ação
Em ação civil pública ajuizada em fevereiro de 2013, O Ministério Público do Trabalho (MPT) requereu a condenação da Air Tiger do Brasil Ltda. ao pagamento das verbas rescisórias, além de indenização por danos morais tanto individual (R$ 20 mil a cada trabalhador prejudicado) quanto coletivo (R$ 200 mil).
Conforme a petição inicial, os trabalhadores demitidos em massa efetuaram reclamação na Comissão Intersindicial de Conciliação Prévia do Comércio e Serviço de Manaus. Naquela ocasião, as partes firmaram acordo por meio do qual foi emitido Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho (TRCT) “zerado” a fim de possibilitar o saque dos valores depositados no FGTS e as guias do seguro-desemprego, com ressalva quanto às demais verbas rescisórias devidas pela empresa, que atua no segmento de transporte de cargas.
A juíza Margarete Dantas Pereira Duque, da 5ª Vara do Trabalho de Manaus, julgou parcialmente procedentes os pedidos e condenou a ré a pagar aos funcionários dispensados as verbas rescisórias, multa de 40% do FGTS, vale-transporte referente à segunda quinzena do mês de setembro de 2013 e multas dos artigos 467 e 477 da CLT.
A magistrada também deferiu o pedido de publicação de edital, após o trânsito em julgado, para que os interessados promovam a execução de seus créditos individualmente, advertindo que, decorrido o prazo de um ano sem a respectiva habilitação, o MPT efetuará a liquidação e a execução dos valores devidos, na forma do artigo 100 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Fonte: TRT 11