Em palestra de abertura do Fórum Internacional de Justiça e Inovação (Fiji) nesta segunda-feira (19), a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, reconheceu a importância da tecnologia e do desenvolvimento científico no direito e nos tribunais de todo o país, mas ressaltou ser ser sempre necessário reafirmar que o ser humano veio antes das máquinas. Para a ministra, os direitos humanos devem ser o vetor e o fundamento de qualquer atuação do ser humano, especialmente no Poder Judiciário.

Na palestra, a ministra discutiu o tema “Inovação, vetor de promoção dos direitos humanos”, ao lado do vice-presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Aloysio Corrêa da Veiga. Ela e o ministro falaram após a presidente do STF, ministra Rosa Weber, que abriu o evento, promovido pelo STF, pelo TST e pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O fórum ocorre hoje e amanhã, na sede do tribunal trabalhista.

Humano x tecnologia

Cármen Lúcia ressaltou que o direito deve ser pensado a partir do humano e para o humano. “É para isso que existe o direito”, afirmou. Segundo ela, a tecnologia garante a todos melhores condições de vida, porém, é necessário que sejam combinadas com condições mínimas de infraestrutura jurídica e social, entre outras, mas garantindo que a humanização não se perca, inclusive no Judiciário. “Somos um conjunto de servidores a serviço do outro”, disse.

Nesse contexto, alertou para o risco de desumanização dos juízes. O desafio, frisou, é que a inovação faça com que o Judiciário seja melhor para o cidadão, no sentido de tornar efetivos os direitos da igualdade e da dignidade, como educação, saúde, entre outros. “Temos uma Constituição Federal e um Supremo para coordenar um povo de muitas humanidades e de enormes desumanidades”, alertou.

A ministra finalizou afirmando ter certeza de que, durante o evento, as ideias sobre inovação serão no sentido de que “as máquinas fiquem no lugar delas, nas salas de máquinas”, e de que as pessoas não se tornem “almoxarifados humanos”, abrindo mão de sua liberdade em detrimento de tudo o que foi construído pelos que vieram antes, e em comprometimento da justiça para aqueles que venham depois.

Educação

O vice-presidente do TST, Aloysio Corrêa da Veiga, disse que as transformações sociais e as mudanças tecnológicas no mundo começaram tímidas e se tornaram vorazes. Ele destacou que, atualmente, ocorrem mudanças enormes em uma mesma geração, situação que, apesar de fantástica, deve ser compatibilizada com o direito humano, para que as pessoas possam viver dignamente. Para ele, é por meio da educação que serão criados valores agregados que possam gerar a inclusão dos seres humanos em um mundo de constantes mudanças tecnológicas.

Ao questionar a natureza das atividades realizadas a partir das plataformas digitais, o ministro destacou a importância de que todas tenham proteção social. Segundo ele, é necessário definir se tais atividades devem seguir as regras da CLT ou devem ser caracterizadas como uma relação de trabalho totalmente diferente e diversa. De toda forma, frisou, é preciso que sejam regulamentadas, pois os trabalhados precisam de proteção social. Para Aloysio Corrêa, “o dever do Estado é proporcionar ao cidadão a felicidade na Terra, e não criar um contingente de excluídos”.

Inovações tecnológicas e trabalho digno

O tema do segundo painel do Fórum Internacional de Justiça e Inovação (Fiji) foi “Novas tecnologias e trabalho digno”. Para o desembargador Francisco Rossal de Araújo, presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4), o momento é de reflexão, sob o ponto de vista ético, sobre os pactos que a sociedade faz ao desafiar o conhecimento.

Para ele, o uso da tecnologia tinha, até agora, a consciência humana como limite, ou seja, só fazia o que a escolha ética de um ser humano fazia. Esse limite, a seu ver, está sendo ultrapassado. “Quando nos deparamos com novas tecnologias que chegam aonde só o cérebro humano chegaria é momento de refletir”, disse.

O desembargador apontou, contudo, que, nesse cenário de inovação, a sociedade e o Judiciário têm que lidar com desafios como o trabalho em condições análogas à escravidão, com a chaga do trabalho infantil e com a discriminação de gênero nos ambientes do trabalho.

Inteligência artificial

Para o pesquisador e professor Diogo Cortiz, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, as informações sobre os trabalhos e profissões ameaçadas pelas inteligências artificiais (IAs) não passam de especulações. Isso porque, na sua avaliação, o processo de transformação ainda está em curso. “Não é novo na história humana que inovações matam postos de trabalho e criam novos. Com as IAs não vai ser diferente, só não se pode saber ainda em que velocidade e magnitude isso vai se dar”, afirmou.

Diogo afirmou que as inteligências artificiais estão no nosso meio já há algum tempo, a diferença de agora, contudo, é que elas estão ao alcance das mãos da sociedade, como é o caso do ChatGPT.

Diálogo social

Para Priscila Lauande, assessora da vice-presidência do Tribunal Superior do Trabalho (TST), os desafios quanto à evolução vão além do enquadramento jurídico dos novos modelos de trabalho, mas passam pelo debate ético e de transparência e necessitam, nesse momento de transição, de um diálogo social. “Os sindicatos têm papel fundamental nesse momento em que não há uma regulação específica, porque podem, de forma eficaz, tutelar a proteção dos direitos dos trabalhadores”, disse.

RR, SP//GG 

Com informações do STF

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