Mesmo antes das Leis 13.429/2017 e 13.467/2017, já era lícita a terceirização de toda e qualquer atividade da empresa, seja ela atividade-meio ou fim


Terceirização

“Ocorre a terceirização quando
uma empresa, em vez de executar serviços diretamente com seus empregados,
contrata outra empresa para que esta os realize, com o seu pessoal sob a sua
responsabilidade. O empregado é contratado pela empresa intermediadora
(empregadora), mas presta serviços em outro local (empresa tomadora).” (CORREIA,
Henrique. Direito do Trabalho para concursos
de analista do TRT, TST e MPU
. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 360).

Desse modo, terceirizar significa
transferir uma ou mais atividades da empresa para que sejam realizados por outra
empresa.

Pessoas envolvidas

Na terceirização, há três pessoas
envolvidas na relação jurídica:

a) trabalhador terceirizado;

b) empresa prestadora de serviços
a terceiros; e

c) empresa contratante.

Regulamentação

Até 2017, não havia uma regulamentação
muito clara em lei tratado sobre a terceirização.

Diante disso, o TST editou a Súmula
nº 331 do TST estabelecendo requisitos para que a terceirização fosse
considerada legítima.

Em 2017, o Congresso Nacional
editou duas leis tratando sobre terceirização:

• Lei nº 13.429/2017: alterou dispositivos
da Lei nº 6.019/74 (lei do trabalho temporário) e dispôs sobre as relações de
trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros.

• Lei nº 13.467/2017: a chamada
Reforma Trabalhista e que também tratou sobre alguns pontos de terceirização.

Posição tradicional do TST

Como disse acima, antes de 2017,
não havia uma lei que dispusesse de forma detalhada a respeito da terceirização.

Assim, o TST editou uma súmula na
qual afirmou que as empresas poderiam fazer a terceirização apenas de suas atividades-meio, mas não de atividades-fim (excepcionalmente, as
empresas poderia fazer a terceirização de atividades-fim, desde que fosse para
trabalho temporário).

Ex: uma escola particular poderia
terceirizar o serviço de vigilância armada. Logo, a escola poderia contratar
uma empresa para fornecer vigilantes que iriam cuidar da segurança do colégio. Tais
vigilantes iriam trabalhar na escola, mas não seriam funcionários dela e sim da
empresa prestadora do serviço (intermediadora).

Isso estava
previsto nos itens I e III da Súmula 331 do TST. Veja:

Súmula 331-TST: CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE

I – A contratação de trabalhadores por empresa
interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos
serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).  

II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa
interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública
direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III – Não forma vínculo de emprego com
o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983)
e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à
atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a
subordinação direta
.

IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do
empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços
quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e
conste também do título executivo judicial.

V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e
indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso
evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº
8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das
obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A
aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações
trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços
abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da
prestação laboral.

Repetindo: a Súmula 331-TST proibia
a terceirização dos serviços principais da empresa (atividade-fim). Ex: uma
escola não poderia terceirizar a contratação dos professores. Como a atividade-fim
da escola é o ensino, os professores obrigatoriamente tinham que ser empregados
do colégio.

Lei nº 13.429/2017

Em março de 2017, foi editada a
Lei nº 13.429/2017 com o objetivo de regulamentar o trabalho temporário e a
terceirização.

“A Lei nº 13.429/2017 não
restringiu os serviços passíveis de terceirização apenas à atividade-meio da
empresa, o que levou à interpretação de que havia sido autorizada a
terceirização nas atividades-fim das empresas, inclusive pelos debates dos
parlamentares que antecederam a votação do projeto. Apesar da ampla possibilidade
de terceirização, a legislação era omissa quanto à possibilidade de terceirização
da atividade-fim e gerava insegurança jurídica, pois a imprecisão da norma em
admitir (ou não) a terceirização em atividade-fim levava à discussão sobre sua
permissão ou não no ordenamento jurídico.” (CORREIA, Henrique. Direito do Trabalho para concursos de analista
do TRT, TST e MPU
. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 360).

Lei nº 13.467/2017

Em julho de 2017, foi editada a
Lei nº 13.467/2017, a chamada Reforma Trabalhista, que também tratou sobre
alguns pontos da terceirização que ainda precisavam ser esclarecidos.

A Lei nº 13.467/2017 foi expressa
ao dizer que a terceirização abrange quaisquer atividades da empresa contratante,
inclusive sua atividade principal (atividade-fim).

Desse modo, não há mais qualquer
dúvida de que com essa Lei passou a ser permitida a terceirização de
atividades-fim da empresa, de forma que a Lei teve como objetivo superar o
entendimento jurisprudencial da Súmula 331 do TST.

E antes das Leis nº 13.429/2017 e
13.467/2017, realmente, era proibida a terceirização de atividades-fim da
empresa? Antes dessas Leis, o entendimento exposto na Súmula 331-TST era válido?

NÃO. Mesmo antes das Leis nº 13.429/2017
e 13.467/2017, já era permitida a terceirização de atividades-fim da empresa. A
Súmula 331 do TST era inconstitucional.

Foi o que
decidiu o STF:

É lícita
a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas
jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas
envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante.

STF. Plenário. ADPF 324/DF, Rel. Min. Roberto
Barroso, julgado em 29 e 30/8/2018 (Info 913).

STF. Plenário. RE 958252/MG, Rel. Min. Luiz Fux,
julgado em 29 e 30/8/2018 (repercussão geral) (Info 913).

Direito do Trabalho passa por
transformações

O Ministro Roberto Barroso
advertiu que, no contexto atual, é inevitável que o Direito do Trabalho passe,
nos países de economia aberta, por transformações.

CF/88 não proíbe a terceirização

Além disso, a Constituição
Federal não impõe a adoção de um modelo de produção específico, não impede o
desenvolvimento de estratégias de produção flexíveis, tampouco veda a
terceirização.

A terceirização não fragiliza a
mobilização sindical dos trabalhadores. Ademais, as leis trabalhistas são de
obrigatória observância pela empresa envolvida na cadeia de valor, tutelando-se
os interesses dos empregados.

O entendimento tradicional do TST
(espelhado na Súmula 331) não estabelece critérios e condições claras e
objetivas que permitam a celebração de terceirização com segurança, de modo a
dificultar, na prática, a sua contratação.

Distinção entre atividade-fim e
atividade-meio está superada

Conforme explicou o Min. Luiz
Fux:

A dicotomia entre “atividade-fim”
e “atividade-meio” é imprecisa, artificial e ignora a dinâmica da economia
moderna, caracterizada pela especialização e divisão de tarefas com vistas à
maior eficiência possível. Frequentemente, o produto ou serviço final
comercializado por uma entidade comercial é fabricado ou prestado por agente
distinto, sendo também comum a mutação constante do objeto social das empresas
para atender a necessidades da sociedade, como revelam as mais valiosas
empresas do mundo.

A doutrina no campo econômico é
uníssona no sentido de que as “Firmas mudaram o escopo de suas atividades,
tipicamente reconcentrando em seus negócios principais e terceirizando muitas
das atividades que previamente consideravam como centrais” (ROBERTS, John. The Modern Firm: Organizational
Design for Performance and Growth. Oxford: Oxford University Press, 2007).

Terceirização traz benefícios aos
trabalhadores

A terceirização resulta em
inegáveis benefícios aos trabalhadores, como a redução do desemprego,
crescimento econômico e aumento de salários, a favorecer a concretização de
mandamentos constitucionais, como a erradicação da pobreza e da marginalização
e a redução das desigualdades sociais e regionais, sem prejuízo da busca do
pleno emprego.

Terceirização, por si só, não
traz prejuízos aos trabalhadores

A terceirização, por si só, não
enseja precarização do trabalho, violação da dignidade do trabalhador ou
desrespeito a direitos previdenciários. Terceirizar não significa
necessariamente reduzir custos. É o exercício abusivo de sua contratação que
pode produzir tais violações.

Para evitar o exercício abusivo,
os princípios que amparam a constitucionalidade da terceirização devem ser
compatibilizados com as normas constitucionais de tutela do trabalhador,
cabendo à contratante observar certas formalidades.

Terceirização é amparada na livre
iniciativa e livre concorrência

A terceirização das atividades-meio
ou das atividades-fim de uma empresa tem amparo nos princípios constitucionais
da livre iniciativa e da livre concorrência, que asseguram aos agentes
econômicos a liberdade de formular estratégias negociais indutoras de maior
eficiência econômica e competitividade.

Em suma:

O STF decidiu que, mesmo antes
das mencionadas Leis, já era LÍCITA a terceirização de toda
e qualquer atividade, meio ou fim
, de forma que não se configura relação
de emprego entre a contratante e o empregado da contratada. Porém, na
terceirização, compete à contratante verificar a idoneidade e a capacidade
econômica da terceirizada e responder subsidiariamente pelo descumprimento das
normas trabalhistas, bem como por obrigações previdenciárias.

Responsabilidade subsidiária da
tomadora dos serviços

A empresa contratante (tomadora
dos serviços) não é considerada a empregadora do trabalhador terceirizado. Em
outras palavras, não existe vínculo empregatício entre a empresa contratante e
o trabalhador terceirizado.

O vínculo do trabalhador
terceirizado é com a empresa prestadora de serviços a terceiros

O que acontece, no entanto, se o
trabalhador terceirizado não for pago pela empresa prestadora dos serviços? Neste
caso, a empresa contratante poderá, de alguma forma, ser chamada a responder?

SIM. Se a empresa prestadora de
serviços não pagar os trabalhadores, a empresa contratante (tomadora dos
serviços) poderá ser condenada a quitar os encargos trabalhistas.

Vale ressaltar que essa responsabilidade
da empresa contratante é SUBSIDIÁRIA (não é solidária!).

Esse era o
entendimento do TST (item IV da Súmula 331) e foi também a solução adotada pelo
legislador:

Lei nº 6.019/74

Art. 5º-A. Contratante é a pessoa
física ou jurídica que celebra contrato com empresa de prestação de serviços
relacionados a quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal.
(Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)

(…)

§ 5º A empresa contratante é
subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao
período em que ocorrer a prestação de serviços, e o recolhimento das
contribuições previdenciárias observará o disposto no art. 31 da Lei nº 8.212,
de 24 de julho de 1991. (Incluído pela Lei nº 13.429/2017)

O STF confirmou que essa
responsabilidade subsidiária é constitucional e deve ser mantida.

Assim, a empresa contratante (tomadora
dos serviços) pode ser responsabilidade subsidiariamente pelas obrigações
trabalhistas não adimplidas pela empresa prestadora de serviços.

Além disso, possui responsabilidade
pelo recolhimento das contribuições previdenciárias devidas por esta.

Vale ressaltar, no entanto, que,
para isso, é indispensável que a empresa contratante tenha participado do processo
judicial.

Desse modo, o entendimento exposto
nos itens IV e VI da Súmula 331 do TST continua válido porque agora foi
incorporado pelas Leis nº 13.429/2017 e 13.467/2017.

Processos transitados em julgado
não são afetados

Vale ressaltar que o entendimento
do TST de que não era permitida, como regra, a terceirização de atividades-fim (itens
I e III da Súmula 331) existe há muitos anos e vários processos foram julgados
com base nele.

Por essa razão, a decisão proferida
pelo STF dizendo que essa parte da Súmula 331 do TST é inconstitucional não
afeta os processos em relação aos quais tenha havido coisa julgada.

Em outras palavras, se algum
processo trabalhista aplicando esses itens da súmula 331 do TST já transitou em
julgado, não será possível a sua alteração agora com base no julgado do STF.

Enunciado 331

Conforme já explicado, o enunciado
331 do TST (na parte que proíbe a terceirização de atividades-fim) foi
considerado inconstitucional por violar os princípios da livre iniciativa e da
liberdade contratual.

Terceirização na Administração Pública

Os julgados do STF acima
comentados não trataram especificamente sobre a terceirização no âmbito da
Administração Pública. A discussão era direcionada para a iniciativa privada.

Desse modo, o STF ainda terá que definir,
de forma mais precisa, os limites da terceirização no serviço público tendo em
vista que, no âmbito da Administração Pública, a regra é no sentido de que as
contratações deverão ocorrer por meio de concurso público (art. 37, II, da CF/88).

Sobre o tema, vale destacar que o
Presidente da República recentemente editou o Decreto nº 9.507/2018, que dispõe
sobre a execução indireta, mediante contratação, de serviços da administração
pública federal (terceirização na administração pública federal).

Esse Decreto prevê que não serão
objeto de execução indireta na administração pública federal direta, autárquica
e fundacional, os serviços:

I – que envolvam a tomada de
decisão ou posicionamento institucional nas áreas de planejamento, coordenação,
supervisão e controle;

II – que sejam considerados
estratégicos para o órgão ou a entidade, cuja terceirização possa colocar em
risco o controle de processos e de conhecimentos e tecnologias;

III – que estejam relacionados ao
poder de polícia, de regulação, de outorga de serviços públicos e de aplicação
de sanção; e

IV – que sejam inerentes às
categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou da entidade,
exceto disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto,
total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal.

Assim, em tese, tirando essas hipóteses,
seria permitida a terceirização de todas as demais atividades.

O STF, contudo, conforme já dito,
será chamado a fixar limites mais claros considerando a regra do concurso público.

Artigo Original em Dizer o Direito

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