O Superior Tribunal Militar (STM) negou habeas corpus, nesta quinta-feira (18), a uma agente da Autarquia Municipal de Trânsito (AMC) de Fortaleza (CE), que responde a ação penal na Justiça Militar da União, por desacato. O possível crime teria sido cometido contra militares do Exército e a intenção da defesa era trancar a ação que tramita na Auditoria de Fortaleza.

Segundo a denúncia do Ministério Público Militar (MPM), no dia 1º de junho do ano passado, por volta das 19h, ao participar de uma blitz de trânsito em rua, próxima à entrada principal do 10º Depósito de Suprimento (10º D Sup), a agente de trânsito teria desacatado um tenente do Exército, que desempenhava a função de oficial-de-dia do quartel, logo após forte discussão.

Segundo a Promotoria, ao solicitar a retirada dos cones que se encontravam em frente ao portão principal do 10º D Sup, prejudicando a saída de viaturas e veículos civis do quartel, a agente não só teria ignorado as solicitações como também proferira expressões grosseiras e de baixo calão, em tom de deboche, aos militares de serviço.

A ação foi filmada por transeuntes e ganhou as páginas de notícias, com ampla repercussão na internet, ainda no mesmo dia.

Após Inquérito Policial Militar, a servidora foi denunciada pelo Ministério Público Militar pelo crime previsto no artigo 299, do Código Penal Militar (CPM): desacato a militar.

Nesta semana, a defesa da ré entrou com pedido de habeas corpus junto ao Superior Tribunal Militar, para trancar a ação penal. De acordo com a defesa, durante a fiscalização, um dos condutores interpelados pelos agentes parou o veículo um pouco além dos cones colocados na via pública quando da primeira abordagem, estando próximo ao portão da unidade militar. A situação, segundo conta o advogado, gerou toda uma problemática e culminou no desentendimento entre a agente e militares do Exército.

A defesa explicou ainda que com a crença de que a blitz estaria impedindo o acesso à área militar, o tenente se dirigiu aos agentes da AMC solicitando que eles retirassem a blitz do local, mas a acusada teria explicado que estava fazendo apenas a abordagem do condutor que havia parado fora da área indicada pelos cones e que não tivera a intenção de bloquear o acesso à área militar.

O advogado alegou que a situação não se amoldaria ao crime de desacato e que a Justiça Militar da União não seria competente para apreciar o pleito. Sustentou ainda que o crime de desacato tolhe o direito à liberdade de expressão e, por isso, fere a Constituição Federal em seus artigos 5º, incisos IV e IX, e 220, devendo ser reconhecida a sua inconstitucionalidade por não recepção neste caso.

Defendeu também que não houve a demonstração do dolo por parte da mulher de atacar a honra do militar ou de ofender a instituição, pois sua intenção, com palavras e críticas, foi impedir o que pensava ser uma lesão a uma operação estatal legítima. “Poder-se-ia afirmar que a atitude da paciente, de falar de forma tão veemente, fora imprudente, porém, não configuraria intenção dolosa e, sim, culposa, não prevista no Código Penal Militar”.

Decisão em recurso

Ao analisar o recurso, o ministro Lúcio Mário de Barros Góes disse que não há dúvida de que o fato descrito na denúncia, regularmente recebida em março deste ano, constitui, em tese, a prática de um crime militar, sendo inquestionável que possui todos os requisitos exigidos pelo artigo 77 do Código de Processo Penal Militar.

Segundo o relator, os documentos anexados às informações prestadas pela autoridade judiciária e extraídos do IPM indicam que tudo está a exigir a conveniente apuração por intermédio do regular contraditório.

“De sorte que, neste momento, não há elementos para se aferir a existência ou não de justa causa para a Ação Penal. É bem verdade que, após a instrução criminal, é possível que o Conselho de Justiça conclua que as provas produzidas não sejam suficientes para a condenação”.

Para o magistrado, a concessão da ordem significaria um julgamento antecipado da lide, subtraindo do primeiro grau de jurisdição o conhecimento da demanda, regularmente instaurada. Quanto às alegações de incompetência da Justiça Militar, de inconstitucionalidade e de incompatibilidade do delito de desacato com a Convenção Americana de Direitos Humanos, o relator informou que não procede a tese da defensa.

No voto, o ministro Lúcio Mário de Barros Góes disse que o artigo 124 da Constituição Federal autoriza à Justiça Militar da União a processar e julgar os crimes militares definidos em lei.

“Ressalte-se que o suposto crime militar imputado à paciente encontra-se definido no artigo 299 do CPM, e foi cometido contra militar no exercício de função de natureza militar em lugar sujeito à administração militar, em conformidade com o previsto no mencionado artigo 9º, inciso III, alínea “b”, do CPM. Desse modo, não há como conceber que tal previsão convencional seja uma carta branca autorizadora para o cometimento de delitos como o presente, cuja conduta típica é descrita como desacatar militar no exercício de função de natureza militar ou em razão dela”.

O magistrado finalizou, fundamentando que a matéria probatória é controversa, necessitando de conveniente apuração por intermédio do regular contraditório. “Como já anteriormente afirmado, a via estreita do habeas corpus não comporta exame aprofundado de prova. A denúncia descreve o fato com as principais circunstâncias, contendo os requisitos legais que permitem o exercício da mais ampla defesa, não ofende a lei, nem é obscura ou contraditória”.

Por maioria, a Corte acatou o voto do relator e mandou a ação penal militar contra a agente de trânsito seguir os ritos processuais legais.

A sessão de julgamento da Corte foi transmitida pela internet.

Processo Relacionado 

HABEAS CORPUS Nº 82-48.2017.7.00.0000 – CE 

 

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