A situação concreta foi a
seguinte:
No dia 15/07/2021, o Presidente
da República promulgou e publicou no Diário Oficial da União a Lei nº
14.183/2021.
Horas depois, ainda no dia
15/07/2021, foi veiculada uma Edição Extra do Diário Oficial da União no qual a
Lei nº 14.183/2021 foi republicada sob o argumento de que houve uma “incorreção”
na versão anterior.
Na primeira publicação, o
Presidente sancionou o art. 8º da Lei nº 14.183/2021.
Ocorre que, logo em seguida, publicou
novamente a mesma Lei, agora vetando o referido art. 8º.
ADPF
O Partido Solidariedade ajuizou
ADPF contra o veto feito nessa nova publicação.
Argumentou que, depois de sancionada,
promulgada e publicada a Lei, não poderia o Presidente da República ter
republicado o diploma com um veto porque houve preclusão.
Diante disso, o Partido afirmou
que esse veto posterior violou preceitos fundamentais da Constituição Federal.
Pediu, portanto, que fosse restabelecida a plena vigência normativa dos art. 8º
da Lei 14.183/2021, conforme publicação veiculada originalmente.
Assiste razão ao Partido? O pedido formulado na ADPF foi julgado
procedente?
SIM.
Ao contrário do que alegou o Partido
autor, a controvérsia no caso concreto não é sequer a discussão de saber se o
veto opera preclusão. O vício aqui foi pelo fato de o veto ao art. 8º ter sido
feito um dia depois de ter expirado o prazo.
Segundo a Constituição Federal, o Presidente da República
dispõe de um prazo de 15 dias para sancionar ou vetar o projeto de lei
aprovado:
Art. 66. A Casa na qual tenha sido
concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que,
aquiescendo, o sancionará.
§ 1º Se o Presidente da República
considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao
interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias
úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito
horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto.
(…)
No presente caso, o prazo para que o Presidente da República
sancionasse ou vetasse o projeto aprovado terminava no dia 14/07/2021. Nesta
data, o Presidente da República editou mensagem de veto e encaminhou o texto
legal para publicação, sem manifestar a intenção de vetar o art. 8º do projeto
de lei.
No dia seguinte (15/07/2021), quando o prazo já havia
expirado, providenciou-se a publicação de edição extra do diário oficial para a
divulgação de novo texto legal com a aposição adicional de veto a dispositivo
que havia sido sancionado anteriormente.
O argumento foi o de que houve erro material. Ocorre que
não há nada que demonstre que tenha havido realmente erro material tanto que na
mensagem de veto enviada dia 14/07/2021 não havia sido feita qualquer menção ao
art. 8º.
Esse tipo de procedimento não se
coaduna com a Constituição Federal, de modo que, ultrapassado o período do art.
66, § 1º, da CF/88, o texto do projeto de lei é, necessariamente, sancionado
(art. 66, § 3º) e o poder de veto não pode mais ser exercido.
A
prerrogativa do poder de veto presidencial somente pode ser exercida dentro do
prazo expressamente previsto na Constituição, não se admitindo exercê-la após a
sua expiração.
Plenário.
ADPF 893/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, redator do acórdão Min. Roberto Barroso,
julgado em 20/6/2022 (Info 1059).
Antes que essa ADPF fosse
julgada, o Congresso Nacional apreciou e manteve o veto do Presidente da República
ao art. 8º. Isso seria motivo suficiente para julgar improcedente a ADPF?
NÃO. O fato de o veto
extemporâneo ter sido mantido não retira a sua inconstitucionalidade. Isso
porque esse veto sequer poderia ter sido apreciado pelo Congresso Nacional.
Caso o Legislativo deseje
encerrar a vigência de dispositivo legal por ele aprovado, deve retirá-lo da
ordem jurídica por meio da sua revogação.
Veja a tese fixada pelo STF:
O poder
de veto previsto no art. 66, § 1º, da Constituição não pode ser exercido após o
decurso do prazo constitucional de 15 (quinze) dias.
STF.
Plenário. ADPF 893/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, redator do acórdão Min. Roberto
Barroso, julgado em 20/6/2022 (Info 1059).
Com base nesse entendimento, o
Plenário, por maioria, julgou procedente a ação para declarar a
inconstitucionalidade do veto adicional publicado na edição extra do Diário
Oficial da União de 15/7/2021 e, assim, restabelecer a vigência do art. 8º da
Lei nº 14.183/2021.
DOD Plus – tema correlato
Não é possível republicar
uma lei já sancionada, promulgada e publicada para incluir novos vetos, ainda
que sob o argumento de que se trata de mera retificação da versão original
Não se admite “novo veto” em lei já promulgada e publicada.
Manifestada a aquiescência do Poder Executivo com projeto de
lei, pela aposição de sanção, evidencia-se a ocorrência de preclusão entre as
etapas do processo legislativo, sendo incabível eventual retratação.
STF. Plenário. ADPF 714/DF, ADPF 715/DF e ADPF 718/DF, Rel. Min.
Gilmar Mendes, julgado em 13/2/2021 (Info 1005).