A oportunidade de construir a nova sede de um dos maiores tribunais do Brasil, ao lado de profissionais como os arquitetos Oscar Niemeyer e Hermano Montenegro. Essa foi a experiência vivenciada pelo engenheiro Guilherme Hudson da Fonseca Gossling Valério e pelo arquiteto Joaquim Gaião Torreão Braz nos seus primeiros anos no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os dois continuam em atividade no tribunal, onde cuidam da infraestrutura predial e passam seus conhecimentos às novas gerações.

Guilherme, engenheiro, e Joaquim, arquiteto, acompanharam a construção da sede do tribunal, inaugurada em 22 de junho de 1995.

A sede do STJ compreende um complexo de 140 mil metros quadrados, pelo qual circulam diariamente cerca de 6 mil pessoas. Segundo Joaquim, o prédio foi o primeiro a ser instalado no Setor de Administração Federal Sul, seguido da posterior construção do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “Chamo este setor de ‘Quadrilátero Niemeyer em Brasília’ porque as quatro sedes que aqui estão são de autoria dele: o STJ, o TST, o TSE e o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), este último ainda inacabado.”

Criado pela Constituição de 1988, o STJ, com seus 33 ministros, começou funcionando em um prédio do Setor de Autarquias Sul. “O prédio antigo foi projetado para o então Tribunal Federal de Recursos (TFR), inicialmente com 11 ministros. Ao longo dos anos, a composição aumentou para 17, depois 23, até chegar a 27 ministros. Quando o STJ foi criado, tivemos que instalar logo de cara mais seis gabinetes. A título de entendimento, enquanto que no TFR só chegavam processos originários da Justiça Federal, o STJ passou a receber processos oriundos tanto da Justiça Federal como também da Justiça estadual, sendo que naquele momento eram processos físicos”, lembra Joaquim.

Concepção

A nova sede foi inaugurada em 22 de junho de 1995, resultado do trabalho de profissionais renomados em suas áreas de atuação. Oscar Niemeyer, responsável pelo projeto, buscou adaptar sua linguagem arquitetônica às necessidades do tribunal. “Niemeyer quis setorizar os diversos tipos de atividades, separando atividade-meio, atividade-fim, gabinetes e os locais das salas de julgamento em blocos distintos. Ele pensou nos diversos prédios dispostos em sequência, formando uma espinha dorsal, com o bloco principal – o dos Plenários – logo na entrada. Esse prédio era a ‘menina dos olhos’ dele, com as salas de julgamento e o salão de recepções sendo especialmente pensados”, afirma Joaquim.

O Edifício dos Plenários é um dos diferenciais da sede do STJ por ter sido executado como um grande bloco, com poucos pilares. “Essa construção é como um tabuleiro de uma ponte, apoiado nessas colunas com formato de tronco de pirâmide. É uma área bem limpa, com pouquíssimas colunas”, esclarece o arquiteto.

Os edifícios conhecidos como Ministros I e II seguem esse padrão, de colunas distantes umas das outras. O Edifício da Administração também é diferente por ter sido construído de cima para baixo. “A execução seguiu a forma inversa da tradicional, em que a construção é feita do primeiro para o último andar. No caso do prédio da Administração, a cobertura foi construída antes dos andares inferiores, e todos eles foram suspensos por cabos de aço, em trechos de 20 metros. A ideia do projeto era manter os espaços livres no nível do pilotis”, diz Guilherme.

Para Joaquim, a união entre o concreto e as áreas verdes é um aspecto que merece destaque. “Gosto muito dos vãos livres e das áreas verdes que se harmonizam com a arquitetura. Isso traduz um aspecto de humanismo muito agradável, pois não é só concreto. Oscar Niemeyer, na última vez em que esteve aqui, disse que os jardins do STJ eram uns dos mais bonitos que ele já havia visto em Brasília, e eles continuam sendo cuidadosamente bem tratados.”

Durante as visitas às obras, Niemeyer propôs algumas adequações ao projeto inicial do Tribunal Pleno, do auditório, do salão de recepções, além da construção de um espelho d’água em frente ao Edifício dos Plenários. “Depois de uma chuva, Niemeyer observou que o reflexo do painel da Marianne Peretti na poça que ficou em frente ao prédio causou uma visão interessante. Assim ele perguntou: ‘Será que não poderiam fazer um espelho d’água aqui sob esse painel?’”, recorda Joaquim.

Inovação

A cerimônia de inauguração foi na manhã de 22 de junho de 1995, e a nova presidência do tribunal tomou posse à tarde. Segundo Joaquim, o ministro William Andrade Patterson, cujo mandato na presidência do STJ acabou no dia da inauguração da nova sede, fez questão de ser o presidente durante aquele momento.

Outra curiosidade é que a nova sede foi um dos primeiros prédios públicos de Brasília a obter a carta de habite-se. Na época, nem a Catedral de Brasília tinha tal documento. A sede do STJ também inovou ao ser um dos primeiros imóveis na cidade a contar com automação predial, a cargo de uma empresa suíça, a Staefa Control System, que presta serviços de supervisão predial ao tribunal até hoje.

Segundo Joaquim, o ar-condicionado de cada ambiente é controlado, assim como a iluminação. A automação também é importante para a economia de energia, item que Guilherme acompanha diariamente desde 1996: “Durante o recesso do fim de ano, por exemplo, já estabeleço novos horários para o funcionamento do ar condicionado. Aí basta programar pelo computador”.

Confiança

Para Guilherme, a simplicidade de Niemeyer chamava a atenção durante suas visitas à sede do STJ. “Ele era simples demais, o que foi excelente. Niemeyer estava aberto às sugestões e adotou algumas mudanças propostas por nós. O Hermano Montenegro também era muito acessível e ficou nosso amigo mesmo, de sair com a gente e ficar hospedado na casa do Vander (Vander Lúcio Ribeiro, servidor aposentado, que também atuou na construção da sede do STJ).”

Das lembranças daquele período, Guilherme destaca a confiança que foi depositada no trabalho dos servidores. “O que guardo daquele momento foi a confiança que tiveram em nós, e tenho consciência de que retribuímos à altura. Normalmente, a fiscalização da construção de prédios públicos é terceirizada, feita integralmente por empresa contratada por meio de licitação. No caso do STJ, o trabalho foi atribuído a três servidores – Joaquim, Vander e eu”, conta o engenheiro.

Joaquim lembra que a obra foi uma de suas primeiras experiências profissionais. “Eu colei grau em janeiro de 1986. A construção do STJ começou para valer em janeiro de 1990. Assim, naquela época eu ainda era um neófito na profissão, mesmo já tendo trabalhado nos projetos de implantação das sedes dos cinco novos Tribunais Regionais Federais. Mas essa experiência foi, sem dúvida nenhuma, um aprendizado ímpar, e para a vida toda”, afirma.

A série 30 anos, 30 histórias apresenta reportagens especiais sobre pessoas que, por diferentes razões, têm suas vidas entrelaçadas com a história de três décadas do Superior Tribunal de Justiça. Os textos são publicados nos fins de semana.

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