O que é fiança?

Fiança é um tipo de contrato por meio do qual uma
pessoa (chamada de “fiadora”) assume o compromisso junto ao credor de que ela
irá satisfazer a obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra (art.
818 do Código Civil).

Outorga
uxória

Se a pessoa for casada, em regra, ela somente poderá ser
fiadora se o cônjuge concordar.

Essa concordância, que é chamada de “outorga uxória/marital”,
não é necessária se a pessoa for casada sob o regime da separação absoluta.

Tal regra encontra-se prevista no art. 1.647, III, do
CC:

Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges
pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:

(…)

III – prestar fiança ou
aval;

Se o cônjuge negar essa autorização sem motivo justo, a
pessoa poderá pedir ao juiz que supra a outorga, ou seja, o magistrado poderá
autorizar que a fiança seja prestada mesmo sem o consentimento.

Feitos esses esclarecimentos, imagine a seguinte situação hipotética:

Pedro aluga seu apartamento para Rui (locatário).

João, melhor amigo de Rui, aceita figurar no contrato como fiador.

Após um ano, Rui devolve o apartamento, ficando, contudo,
devendo 4 meses de aluguel.

Pedro propõe uma execução contra Rui e João cobrando o valor
devido. O juiz determina a penhora da casa em que mora o João e que está em seu
nome.

É possível a penhora da casa de João, mesmo sendo bem de família?

SIM. A impenhorabilidade do bem de família não se aplica no
caso de dívidas do fiador decorrentes do contrato de locação. Veja:

Lei n.° 8.009/90

Art. 3º A
impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal,
previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:

(…)

VII – por obrigação
decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Embargos de terceiro

Maria, companheira de João, apresenta embargos de terceiro
contra Pedro (exequente), alegando que a fiança prestada foi nula em razão da
falta de outorga uxória já que ela, na condição de companheira, não autorizou o
ato.

Afirmou, ainda, que convivia em união estável com João há
muitos anos e que eles já tinham até mesmo feito uma escritura pública reconhecendo
essa relação.

A pergunta que surge agora é a seguinte: a outorga uxória/marital é
necessária também no caso de união estável? Uma pessoa que viva em união estável
com outra, se quiser prestar fiança, precisará da autorização de seu(sua)
companheiro(a)?

NÃO. Na união estável não se exige o consentimento do
companheiro para a prática dos atos previstos no art. 1.647 do CC.

Assim, uma pessoa que viva em união estável com outra pode
prestar fiança sem a necessidade de autorização de seu(sua) companheiro(a).

Logo, NÃO é nula a fiança prestada por fiador convivente em
união estável sem a autorização de sua companheira.

Entendimento do STJ

Esse foi o entendimento adotado pela 4ª Turma do STJ no Resp
1299894/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 25/02/2014.

Qual é o fundamento para essa conclusão?

O STJ considerou que a fiança prestada sem a autorização do
companheiro é válida porque é impossível ao credor saber se o fiador vive ou
não em união estável com alguém.

Como para a caracterização da união estável não se exige um
ato formal, solene e público, como no casamento, fica difícil ao credor se
proteger de eventuais prejuízos porque ele nunca terá plena certeza se o fiador
possui ou não um companheiro.

Segundo o Min. Luis Felipe Salomão, é certo que não existe superioridade
do casamento sobre a união estável, sendo ambas equiparadas constitucionalmente.
Isso não significa, contudo, que os dois institutos sejam inexoravelmente coincidentes,
ou seja, eles não são idênticos.

Vale ressaltar que o fato de o fiador ter celebrado uma escritura
pública com sua companheira, disciplinando essa união estável, não faz com que
isso altere a conclusão do julgado. Isso porque para tomar conhecimento da
existência dessa escritura, o credor teria que percorrer todos os cartórios de
notas do Brasil, o que se mostra inviável e inexigível.

Dessa forma, o STJ considerou que não é nula nem anulável a
fiança prestada por fiador convivente em união estável, sem a outorga uxória,
mesmo que tenha havido a celebração de escritura pública entre os consortes.

Artigo Original em Dizer o Direito

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