Para encerrar o Encontro da Justiça Militar da União com a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), o ministro do Supremo Tribunal Federal Francisco Rezek traçou um panorama sobre a atuação da CIDH no contexto de importantes casos dos últimos anos, como a ordem de paralisação da obra da Usina de Belo Monte e da sentença do caso Mendes Lopes, que resultou na primeira condenação do Brasil pela Corte Interamericana.

Casos envolvendo a decisão do governo da Bolívia em declarar nacionais as refinarias da Petrobrás e a decisão da justiça brasileira de não atender ao pedido da Itália pela extradição de Cesare Battisti foram apontados como situações hipotéticas em que os Estados soberanos envolvidos poderiam acionar a Corte de Haia para decidir os processos. O ministro utilizou esses exemplos para ilustrar a especificidade da Corte de Haia que exerce jurisdição unicamente nos conflitos entre estados soberanos.

Em relação à Corte Interamericana de Direitos Humanos, Francisco Rezek destacou “a grande utilidade em dispor de um mecanismo de uma organização regional de controle dos direitos humanos quando se leva em conta certas situações em que as sociedades nacionais, e a própria comunidade jurídica, se acostumam com algo que é patológico, e não se dão conta dessa patologia a menos que um órgão internacional lhes dê um recado corretivo”.

No entanto, o ministro reflete a aparente “concorrência entre uma corte regional de direitos humanos e os tribunais e autoridades internas de direitos humanos”. Na visão de Rezek, isso acontece principalmente pelo cenário de sociedade internacional descentralizada da atualidade em que 193 estados soberanos não constituíram até hoje uma espécie de autoridade supranacional. “Os mecanismos internacionais são todos de coordenação e não de subordinação. Ainda por muitos anos isso irá perdurar, a constituição de cada estado soberano é a âncora que uma sociedade nacional pode contar para buscar a sua segurança jurídica”, avaliou o palestrante.

No sentido de aperfeiçoar a atuação da Comissão e da Corte Interamericana de Direitos Humanos, Francisco Rezek apontou pontos que merecem reflexão. A começar pela questão do tempo, o ministro declarou ser conveniente que a CIDH se concentre mais no presente e no futuro do que no passado. Segundo Rezek, o convênio assinado entre o Conselho Nacional de Justiça e o Sistema Interamericano nesta semana serve “para arejar as cabeças da justiça criminal à luz dos princípios modernos de processo penal e de preservação dos direitos humanos. Projeta a competência dessas instituições para o futuro. O sistema de proteção dos direitos humanos não se deve converter em uma inquisição dos direitos humanos violados no passado”.

Para Francisco Rezek, o sistema interamericano deve empreender esforços para não interferir nas opções políticas das várias nações soberanas que se submeteram ao Pacto San José de Costa Rica. Um dos exemplos que embasam o ponto de vista do ministro foi a determinação da CIDH para paralisar a construção da Usina Belo Monte. “A questão havia sido decidida por um governo, legislada pelo Congresso e submetida ao STF que declarou sua constitucionalidade. Obras desse porte obviamente têm efeitos colaterais. A prerrogativa de qualquer governo é sopesar a relação custo/benefício”.

O palestrante ainda enfatizou que lidar com direitos humanos não deve ser encarado pelos organismos internacionais e domésticos como uma tarefa simplista. A universalidade desses direitos representa um desafio constante. Exemplos como a proibição pelo estado da França ao uso do véu islâmico ilustram o problema. “Em que medida a ideia da universalidade dos direitos humanos nos permite interferir em ações que poderiam ser toleradas?”

Rezek destacou que o Supremo Tribunal Federal vai se deparar cada vez mais com essa ambiguidade dos direitos humanos, como nas situações em que terá que decidir sobre pesquisas com células-tronco embrionárias e a legalização do aborto. “Nesses casos, o Supremo irá prestigiar esse direito humano ou aquele e amargará o sacrifício daquele que não prevaleceu”, finalizou o ministro. 

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