Três civis foram condenados no Superior Tribunal Militar (STM) pelo crime de violência contra militar. As penas foram fixadas entre 1 ano e 4 meses e 1 ano e 7 meses de reclusão, sendo que uma das peculiaridades do crime é que ele pode se configurar mesmo que a vítima não tenha sofrido nenhum tipo de lesão corporal.
De acordo com a denúncia, o fato ocorreu em junho de 2016, por volta das 9h30, e a ação teria sido cometida por dois homens que trafegavam pela Avenida Marcolino Cabral, na cidade de Tubarão (SC), no interior de um veículo Toyota Corolla. Ao se aproximarem do Próprio Nacional Residencial (PNR), do Comandante da 3ª Companhia do 63º Batalhão de Infantaria (63º BI), teriam atirado pedras na sentinela que ocupava o respectivo posto.
Um dos soldados que estava de serviço no Posto “E”, localizado do outro lado da rua, descreveu que conseguiu observar a dinâmica dos acontecimentos. Mencionou que se o ofendido não tivesse se abrigado, seria atingido. Acrescentou que os objetos foram lançados de dentro do carro em direção à sentinela e que, após a identificação dos envolvidos, os policiais militares retornaram ao local e pegaram a pedra maior.
Conforme o laudo pericial, o objeto arremessado se tratava de um fragmento rochoso, classificado como granito, com peso de 860,78 gramas e medindo cerca de 11 cm, informações que comprovam o poder lesivo do artefato.
Na delegacia de Polícia Militar, um dos policiais que registraram a ocorrência do fato confirmou que a interceptação do automóvel apenas foi realizada após a ratificação das informações prestadas pela vítima, e que esta teria ocorrido cerca de 5 a 10 minutos após o acionamento da guarnição.
A Auditoria de Curitiba condenou os réus, em primeira instância, pela prática do crime previsto no art. 158, § 1º, c/c art. 53, caput, e art. 30, II, todos do Código Penal Militar (CPM), a pena de 1 ano e 8 meses de reclusão, sem direito ao sursis diante dos múltiplos maus antecedentes dos apelantes. Todavia, concedeu o direito de apelar em liberdade e fixou o regime inicial aberto para o cumprimento da sanção.
Redução das penas
Ao julgar o caso no STM, o relator do processo, ministro Péricles Aurélio Lima de Queiroz, afirmou que a prova testemunhal, aliada à congruência no depoimento da vítima eram suficientes em demonstrar a autoria e a materialidade delitiva.
A defesa de ambos os acusados alegou a existência de relação conflituosa anterior entre o ofendido e um dos ofensores, que já teriam se desentendido no bairro onde residiam, motivo pelo qual a vítima, ao vislumbrar a passagem do automóvel ocupado pelo seu desafeto, teria inventado o cometimento do delito.
Afirmou também que a testemunha ocular, o soldado que estava de serviço próximo ao local do delito, seria amigo particular da vítima e por isso teria corroborado com a sua versão fática apenas para lhe ajudar a prejudicar o seu desafeto. Nesse sentido, os advogados requereram a absolvição pela insuficiência de provas aptas à condenação.
O ministro relator declarou não haver provas nos autos que fundamentem as alegações e também rejeitou o pedido de “intervenção mínima”, requerido pela defesa. O princípio da intervenção mínima consiste em destinar ao direito penal a tutela dos bens jurídicos mais relevantes para a sociedade. No entanto, o relator afirmou que, em que pese o fato de o crime ter sido praticado na modalidade tentada – não ocasionou nenhuma lesão à vítima –, faz-se necessária a aplicação do direito penal militar ao caso em questão. Isso porque o que está sob tutela (proteção) é não apenas a integridade física de alguém, mas também a disciplina e a autoridade militar.
“No caso concreto, nota-se necessária a intervenção criminal, uma vez que a ação dos sujeitos ativos culminou na efetiva ofensa aos citados bens jurídicos. O serviço de guarda restou comprometido, não só pelo abalo físico, consistente na necessidade da sentinela de se abrigar para não ser atingida pela pedra, como pelo abalo psicológico e moral de toda a guarnição, que alterou a rotina do aquartelamento e prejudicou, de forma potencial, a defesa da unidade”, resumiu o ministro Péricles.
No entanto, o relator acolheu as razões apresentadas pelas defesas para a diminuição das penas, como, por exemplo, o fato de um dos réus não ter antecedentes criminais – embora assim tenha sido considerado pela primeira instância –, mas apenas estar respondendo a um processo que está judicialmente suspenso, conforme o art. 89 da Lei 9.099/1995. Segundo o ministro, apenas podem ser aferidas negativamente como antecedentes as condutas criminosas submetidas à sentença penal condenatória com trânsito em julgado, o que não é o caso em questão.
Como resultado, as penas finais, que eram todas de 1 ano e 8 meses, passaram para 1 ano e 4 meses para dois dos réus e 1 ano e 7 meses para o terceiro.
Peculiaridades sobre o crime de violência contra militar
Durante o julgamento, o ministro Péricles comparou como o crime de violência contra militar é tratado em países da América Latina e da Europa. Inicialmente, lembrou que, no Brasil, o crime pune aquele que pratica ato violento contra Oficial de Dia, de serviço, ou de quarto, ou em face de sentinela, vigia ou plantão, com a pena de reclusão de 3 a 8 anos. Se a agressão for praticada na forma do §1º, a pena é aumentada em um terço.
Segundo lembrou o ministro, de acordo com o Código Penal Militar brasileiro, o delito de violência contra militar de serviço não exige a efetivação da lesão corporal. É suficiente para a consumação qualquer ato violento, o qual, no caso concreto, sequer restou consumado.
Na legislação estrangeira, também há descrição similar em diversos países. O Código Penal Militar Policial do Peru dispõe, em seu art. 121, que será sancionado com pena privativa de liberdade de 2 a 6 anos aquele que atacar sentinela, vigia, guarda ou pessoal designado para cobrir o serviço de segurança.
Na Colômbia, o art. 128 do CPM dispõe que o Ataque a Sentinela é punido com 2 a 5 anos de prisão. O Uruguai pune com 4 a 24 meses de prisão aquele que comete delito contra a vigilância, com ou sem violência física, que pretende se sobrepor à autoridade da sentinela − art. 46 do Código Penal Militar.
No mesmo sentido, o art. 34 do CPM espanhol sanciona aquele que maltrata o militar em serviço com 4 meses a 3 anos de prisão, sem prejuízo da pena correspondente ao resultado lesivo. O Código de Justiça Militar de Portugal prevê, no seu art. 68, a sanção de 1 a 4 anos àquele que, injustificadamente, desarmar sentinela ou ofender, no corpo ou na saúde.
Por fim, vale fazer menção ao art. 142 do Codice Penale Militare di Pace italiano, o qual sanciona com 1 a 5 anos o militar que pratica ato de violência contra companheiro de serviço.