O réu confessou o crime. O juiz, na sentença, não menciona a confissão e fundamenta a condenação em outras provas. Mesmo assim, ele terá direito à atenuante?


A confissão espontânea é atenuante genérica prevista no art. 65, III,
“d”, do CP:

Art. 65. São circunstâncias que sempre atenuam a pena:

III — ter o agente:

d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;

 

Em 2015, o STJ editou a Súmula 545 dizendo o seguinte:

Súmula 545-STJ: Quando a confissão for utilizada para a formação do
convencimento do julgador
, o réu fará jus à atenuante prevista no artigo
65, III, d, do Código Penal.

 

Vimos acima que a Súmula 545
fala que se o órgão julgador utilizar a confissão na decisão condenatória, o
réu terá direito à atenuante. E se o órgão julgador não mencionar essa
circunstância na decisão? E se o indivíduo confessa, mas o juiz não menciona
expressamente essa confissão na sentença, mesmo assim ele terá direito à
atenuante?

SIM. O réu também terá
direito à atenuante mesmo que o órgão julgador não mencione expressamente a
confissão na decisão.

 

Direito à atenuação da pena surge no momento
da confissão

O
art. 65, III, “d”, do CP não exige, para sua incidência, que a confissão do réu
tenha sido empregada na sentença como uma das razões da condenação. O direito
subjetivo do réu de ver a sua pena atenuada surge quando ele confessa. Esse é o
momento constitutivo do direito. Ele confessou, surgiu o direito à atenuação.
Quando o juiz cita a confissão do réu na fundamentação da sentença
condenatória, isso é apenas um momento meramente declaratório.

 

Exigir
que o juiz mencione na sentença para reconhecer a atenuante viola o princípio
da legalidade

Viola o princípio da legalidade condicionar a
atenuação da pena à citação expressa da confissão na sentença como razão
decisória, especialmente porque o direito subjetivo e preexistente do réu não
pode ficar disponível ao arbítrio do julgador.

Se
a lei condicionasse a atenuação da pena à menção da confissão na sentença
condenatória, haveria um pressuposto adicional que mudaria o momento
constitutivo do direito subjetivo do réu.

Da
mesma forma, caso o art. 65, III, “d”, do CP impusesse à confissão pressupostos
adicionais, não previstos para as demais atenuantes, ou exigisse que a
confissão produzisse certos efeitos práticos sobre a investigação criminal, não
haveria que se falar em legítima expectativa à redução da pena por parte do
acusado que não cumprisse todos os requisitos legais.

 

Exigir
que o juiz mencione na sentença para reconhecer a atenuante viola o princípio
da isonomia

Essa restrição ofende também os princípios da
isonomia e da individualização da pena, por permitir que réus em situações
processuais idênticas recebam respostas divergentes do Judiciário, caso a
sentença condenatória de um deles elenque a confissão como um dos pilares da
condenação e a outra não o faça.

 

Atenuante
da confissão espontânea não está condicionada aos efeitos desse ato

Ao
contrário da colaboração premiada, a atenuante da confissão não se fundamenta
nos efeitos ou facilidades que a admissão dos fatos pelo réu eventualmente
traga para a apuração do crime. Em outras palavras, não existe na confissão
espontânea a necessidade de se demonstrar uma “dimensão prática” desse ato. O
que se premia é o “senso de responsabilidade pessoal do acusado”, que é
característica de sua personalidade, na forma do art. 67 do CP. A confissão
está relacionada, portanto, a uma “dimensão psíquico-moral”.

Justamente
por isso, o fato de o réu ter sido preso em flagrante ou o fato de haver outras
provas contra ele não autorizam o julgador a recusar a atenuação da pena, em
especial porque a confissão, enquanto espécie sui generis de prova,
corrobora objetivamente as demais.

 

Sistema
de proteger a boa-fé do acusado

O
sistema jurídico precisa proteger a confiança depositada de boa-fé pelo acusado
na legislação penal, tutelando sua expectativa legítima e induzida pela própria
lei quanto à atenuação da pena.

A
decisão pela confissão, afinal, é ponderada pelo réu considerando o trade-off
entre a diminuição de suas chances de absolvição e a expectativa de redução da
reprimenda.

É
contraditória e viola a boa-fé objetiva a postura do Estado em garantir a
atenuação da pena pela confissão, na via legislativa, a fim de estimular que
acusados confessem; para depois desconsiderá-la no processo judicial,
valendo-se de requisitos não previstos em lei.

 

Em suma:

 

Perceba, portanto, que essa
decisão da 5ª Turma amplia o campo de incidência da Súmula 545 do STJ.

 

Artigo Original em Dizer o Direito

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.