Para ocorrer indenização por danos morais em função do encontro de corpo estranho em alimento industrializado, é necessária a sua ingestão?


CASO 1
(COMEU O OBJETO ESTRANHO)

Imagine
a seguinte situação hipotética:

João
comprou um bolinho industrializado de morango no supermercado.

Ele
retirou o bolinho da embalagem e deu a primeira mordida, momento em que sentiu
um gosto estranho e percebeu que havia comido metade de um inseto que estava
dentro do produto.

Diante
disso, ele ingressou com ação de indenização por danos morais contra a
fabricante do produto em litisconsórcio com o supermercado.

João
terá direito de ser indenizado por danos morais. Isso porque a jurisprudência
do STJ está consolidada no sentido de que há dano moral na hipótese em que o
produto alimentício é consumido, ainda que parcialmente, em condições
impróprias, especialmente quando apresenta situação de insalubridade
oferecedora de risco à saúde ou à incolumidade física.

A
fabricante do bombom poderá se isentar de indenizar o consumidor alegando que a
culpa pela existência do objeto estranho foi do supermercado que não
acondicionou corretamente o produto, o submetendo a calor excessivo?

NÃO.
O consumidor pode cobrar a indenização de todos os que fazem parte da cadeia produtivo.
Posteriormente, o fabricante poderá ingressar com ação de regresso contra o
supermercado, se for o caso, cobrando aquilo que pagou ao consumidor. Sobre o
tema:

Em se tratando de relação de consumo, são solidariamente
responsáveis todos da cadeia produtiva, nada impedindo que a parte que
comprovar não ter a culpa possa exercer ação de regresso para ser reembolsado
do valor da indenização.

STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 1095795/MG, Rel. Min. Maria Isabel
Gallotti, julgado em 22/03/2018.

CASO 2 (NÃO
CHEGOU A COMER O OBJETO ESTRANHO)

Imagine
agora uma situação diferente:

Maria
comprou um bombom de chocolate no supermercado.

Ao
retirar o chocolate da embalagem, Maria percebeu que havia larvas na superfície
do bombom.

Diante
disso, ajuizou ação de indenização por danos morais contra a fabricante do
produto em litisconsórcio com o supermercado.

As
rés alegaram, dentre outros argumentos, que não houve dano moral, considerando
que Maria não engoliu o corpo estranho. Logo, do evento não advieram
consequências significativas.

Para
ocorrer a indenização por danos morais em função do encontro de corpo estranho
em alimento industrializado, é necessária a sua ingestão? Para configurar dano
moral é necessário que o consumidor ENGULA o objeto estranho presente no
alimento?

A jurisprudência é dividida, havendo
duas correntes sobre o tema:

SIM

NÃO

Só haverá condenação por
danos morais se o consumidor engolir o objeto estranho

Haverá danos morais ainda que
não ocorra a ingestão de seu conteúdo

Ausente a ingestão do produto
considerado impróprio para o consumo em virtude da presença de corpo
estranho, não se configura o dano moral indenizável.

Não há dano moral na hipótese
de aquisição de gênero alimentício com corpo estranho no interior da
embalagem se não ocorre a ingestão do produto considerado impróprio para
consumo, visto que referida situação não configura desrespeito à dignidade da
pessoa humana, desprezo à saúde pública ou mesmo descaso para com a segurança
alimentar.

A ausência de ingestão de
produto impróprio para o consumo configura, em regra, hipótese de mero
dissabor vivenciado pelo consumidor, o que afasta eventual pretensão
indenizatória decorrente de alegado dano moral.

A aquisição de produto de
gênero alimentício contendo em seu interior corpo estranho, expondo o
consumidor a risco concreto de lesão à sua saúde e segurança, ainda que não
ocorra a ingestão de seu conteúdo, dá direito à compensação por dano moral,
dada a ofensa ao direito fundamental à alimentação adequada, corolário do
princípio da dignidade da pessoa humana.

O simples ato de “levar à
boca” o alimento industrializado com corpo estranho gera dano moral in re ipsa, independentemente de sua
ingestão.

A disponibilização de produto
considerado impróprio para consumo em virtude da presença de objeto estranho
no seu interior afeta a segurança que rege as relações consumeristas na
medida que expõe o consumidor a risco de lesão à sua saúde e segurança e,
portanto, dá direito à compensação por dano moral.

STJ. 3ª Turma. AgInt no REsp
1597890/SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, j. em 27/09/2016.

STJ. 4ª
Turma. AgRg no AREsp 489.030/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j.
16/04/2015.

STJ. 3ª Turma. REsp
1644405/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 09/11/2017.

STJ. 3ª Turma. REsp
1744321/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 05/02/2019.

Obs: neste caso do bombom com larva, a 3ª Turma do STJ
condenou os réus a pagarem R$ 10 mil de indenização à consumidora (REsp
1744321/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 05/02/2019).

Artigo Original em Dizer o Direito

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