Imagine
a seguinte situação hipotética:

João
comeu um iogurte e passou mal.

Diante
disso, ajuizou ação de indenização por danos morais e materiais contra a
fabricante do iogurte e contra o supermercado onde ele foi adquirido, em
litisconsórcio passivo.

Em
contestação, a supermercado arguiu sua ilegitimidade passiva pedindo a sua
exclusão imediata da lide.

O
juiz, por meio de decisão interlocutória, rejeitou a alegação de ilegitimidade
determinando que os dois réus (fabricante e supermercado) continuassem na lide
e que o processo seguisse normalmente com a realização de instrução probatória.

O supermercado não se conformou com a
decisão e interpôs agravo de instrumento afirmando que esse recurso seria
cabível com base no inciso VII do art. 1.015 do CPC/2015:

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento
contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:

(…)

VII – exclusão de litisconsorte;

O
recurso será conhecido? Cabe agravo de instrumento nesta hipótese?

NÃO.

Não
cabe agravo de instrumento contra decisão de indeferimento do pedido de
exclusão de litisconsorte.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.724.453-SP, Rel.
Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/03/2019 (Info 644).

Taxatividade
mitigada

O
art. 1.015 do CPC/2015 prevê as hipóteses de cabimento do agravo de
instrumento.

Segundo
decidiu o STJ, o art. 1.015 do CPC/2015 traz um rol de taxatividade mitigada.

O
que isso significa?

Em
regra, somente cabe agravo de instrumento nas hipóteses listadas no art. 1.015
do CPC/2015.

Excepcionalmente, é possível a interposição
de agravo de instrumento fora da lista do art. 1.015, desde que preenchido um
requisito objetivo: a urgência.

O rol do art. 1.015 do CPC é de
taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento
quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão
no recurso de apelação.

STJ. Corte Especial.REsp 1704520-MT,
Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 05/12/2018 (recurso repetitivo) (Info
639).

Interpretação
do inciso VII do art. 1.015

O
inciso VII do art. 1.015 prevê que cabe agravo de instrumento contra “decisões interlocutórias
que versarem sobre exclusão de litisconsorte”.

O
STJ afirma que essa expressão prevista no inciso VII abrange somente a decisão
que exclui o litisconsorte.

Por
outro lado, não cabe agravo de instrumento contra a decisão que rejeita
a arguição de ilegitimidade passiva feita pelo réu/litisconsorte (decisão que
rejeita a exclusão do litisconsorte).

Erro
na exclusão do litisconsorte fará com que a sentença seja anulada

Imaginemos que, logo após a contestação, o juiz, por meio
de decisão interlocutória, excluiu um litisconsorte.

Suponhamos
(apesar para argumentar) que não coubesse agravo de instrumento.

O
feito prosseguiria normalmente e seriam praticados vários atos processuais.

Ao
final, o juiz profere sentença de procedência condenando os litisconsortes.

É
interposta apelação.

O
Tribunal de Justiça conclui que o juiz errou lá no início do processo ao
excluir o litisconsorte e que ele deveria sim ter figurado no polo passivo da
lide. O que aconteceria neste caso? O Tribunal teria que anular a sentença e
todos os atos processuais praticados após a exclusão do litisconsorte.

Perceba,
portanto, que haveria um enorme prejuízo.

Justamente
por essa razão, o inciso VII do art. 1.015 prevê que cabe agravo de instrumento
contra a decisão interlocutória que excluir litisconsorte. Essa decisão deve
ser impugnada imediatamente, devendo ser decidida logo para evitar um grande
prejuízo no futuro caso seja revertida.

Erro
na manutenção do litisconsorte não faz com que a sentença seja anulada

Imaginemos agora que, logo após a contestação, o juiz,
por meio de decisão interlocutória, rejeitou o pedido de um dos réus
(litisconsorte 2) para ser excluído da lide. Em outras palavras, o juiz manteve
o litisconsorte.

Suponhamos
que não cabe agravo de instrumento.

O
feito prossegue normalmente e são praticados vários atos processuais.

Ao
final, o juiz profere sentença de procedência condenando os litisconsortes.

É
interposta apelação.

O
Tribunal de Justiça conclui que o juiz errou lá no início do processo ao não
ter excluído o litisconsorte, ou seja, o réu realmente era parte ilegítima.
Haverá nulidade da sentença por conta disso? Não. O Tribunal irá simplesmente
reformar a sentença para julgar improcedente o pedido contra esse litisconsorte
2.

A
manutenção, no processo, de uma parte alegadamente ilegítima não fulmina a
sentença de mérito nele proferida, podendo o Tribunal, por ocasião do
julgamento do recurso de apelação, reconhecer a ilegitimidade da parte e,
então, exclui-la do processo.

Perceba,
portanto, que, ao contrário da situação anterior, não haverá aqui, para o
processo, um enorme prejuízo.

Justamente
por essa razão, o STJ diz: neste segundo caso (decisão interlocutória mantendo
o litisconsorte) não cabe agravo de instrumento, sendo possível esperar mais um
pouco e que esse tema seja eventualmente apreciado somente na apelação.

Na
primeira situação há um prejuízo endoprocessual; na segunda, um prejuízo
econômico à parte

Haverá,
não há dúvida, transtornos à parte que será mantida em processo do qual não
deveria participar, mas, evidentemente, esse prejuízo é infinitamente menor do
que àquele causado pela exclusão, prematura e errônea, de quem necessariamente
deveria dele participar.

Na
primeira hipótese, pode-se cogitar de um prejuízo meramente econômico
exclusivamente da parte não excluída.

Na
segunda hipótese, contudo, haverá um grave prejuízo endoprocessual, que
atingirá todos os sujeitos e invalidará a sentença de mérito, que é resultado
buscado no processo.

Interpretação
teleológica e sistemática

O legislador, quando quis dizer que
cabe agravo de instrumento contra a decisão que acolhe ou rejeita o pedido da
parte, ele disse isso expressamente. Como é o caso, por exemplo, do inciso IX:

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento
contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:

(…)

IX – admissão
ou inadmissão
de intervenção de terceiros;

No
inciso VII, por outro lado, ele não mencionou isso expressamente, de forma que
se deve interpretar que só cabe o agravo de instrumento se a questão não puder
esperar até o julgamento da apelação.

Não
cabimento de intepretação extensiva ou analogia no rol do art. 1.015

O
STJ, no mesmo julgamento que definiu que o rol do art. 1.015 é de taxatividade
mitigada, também decidiu que não é possível o uso da interpretação extensiva e
da analogia para ampliar as hipóteses de cabimento do agravo de instrumento.

Cabe
agravo de instrumento contra decisão interlocutória envolvendo LITISCONSORTE?

Juiz
EXCLUIU o litisconsorte: SIM

cabe
agravo de instrumento

Juiz
MANTEVE o litisconsorte: NÃO

Não
cabe agravo de instrumento

Há urgência em se definir essa questão imediatamente.
Isso porque se o Tribunal determinar o retorno, os atos processuais terão que
ser repetidos com a participação do litisconsorte.

Não há
urgência em se definir essa questão imediatamente. Isso porque mesmo que o
litisconsorte seja excluído mais para frente, não haverá prejuízo aos atos
processuais praticados.

Há um risco de enorme prejuízo endoprocessual com a
anulação da sentença.

Não há risco de anulação da sentença por esse motivo. O
prejuízo, se houver, será meramente econômico da parte que teve que ficar no
processo até o final.

Artigo Original em Dizer o Direito

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