regulamenta, nos arts. 814 a 817, os contratos de jogo e de aposta. Apesar de
serem tratados no mesmo capítulo, jogo e aposta possuem distinções:
Jogo
|
Aposta
|
Jogo é o ajuste em que duas ou
mais pessoas prometem, entre si, pagar certa quantia ou entregar determinado bem àquela que sair vencedora na prática de determinada competição que os contratantes combinam. |
Aposta é o ajuste em que duas
ou mais pessoas prometem, entre si, pagar certa quantia ou entregar determinado bem àquela cujo ponto de vista a respeito de fato praticado por outrem se verifique ser o verdadeiro. |
O êxito ou o insucesso dependem
da atuação de cada jogador.
Leva a quantia ou o bem prometido
àquele que for melhor na competição. |
O êxito ou o insucesso dependem
da atuação de terceiros.
Leva a quantia ou o bem
prometido àquele cuja opinião a respeito de fato futuro e incerto prevalecer. |
O resultado decorre da
participação dos contratantes. |
O resultado não depende das
partes, mas de um ato ou fato alheio e incerto. |
foi fornecido por um jurista estrangeiro chamado Tholl:
jardim, observam dois caracóis em cima de uma mesa, fechando disputa sobre qual
deles chegaria primeiro ao outro lado. A hipótese é de aposta. Mas, caso
contrário, ou seja, se os indivíduos em questão colocarem os caracóis sobre a
mesa, disputando qual chegará em primeiro lugar ao outro lado, haverá jogo.
Chegando mais próximo aos nossos tempos, indaga-se: uma luta do UFC é jogo ou aposta?
estão dentro do octógono, trata-se de um jogo. No entanto, para os expectadores
que arriscam dinheiro tentando adivinhar qual lutador irá vencer o duelo,
cuida-se de aposta.
Resumindo, no jogo, os jogadores
participam do processo, podendo, em certos momentos, influenciar o resultado.
Na aposta, não há participação dos apostadores, não tendo eles a menor
possibilidade de influenciar o resultado.
Espécies de jogos ou apostas
permitidos e tolerados.
Proibidos (ilícitos)
|
Permitidos (autorizados)
|
Tolerados
|
O resultado depende
exclusivamente da sorte.
São, por isso, chamados de
“jogos de azar”. |
O resultado não decorre
exclusivamente da sorte, sendo influenciado pela habilidade, força ou inteligência dos participantes. |
O resultado não decorre
exclusivamente da sorte, sendo influenciado pela habilidade, força ou inteligência dos participantes. |
A pessoa que vence não pode ingressar com uma
ação judicial compelindo a outra a pagar a quantia prometida. |
A pessoa que vence pode ingressar com uma ação
judicial compelindo a outra a pagar a quantia prometida. |
A pessoa que vence não pode ingressar com uma
ação judicial compelindo a outra a pagar a quantia prometida. |
Sua prática, com intuito
econômico, é punida como contravenção penal (art. 50 do Decreto-Lei 3.688/1941). |
Sua prática é regulamentada e
incentivada pelo Poder Público. |
Sua prática não é
regulamentada, mas apenas tolerada pelo Poder Público. |
Exs: jogo do bicho, roleta do
cassino, jogo de dados, víspora, bacará etc. |
Exs: campeonatos esportivos
autorizados pelo Poder Público (futebol, vôlei, boxe, sinuca, xadrez, dominó), Mega-Sena, Lotomania. |
Exs: disputas informais de
esportes, isto é, sem um campeonato regulamentado, “bolões de apostas entre amigos”. |
o que a Lei das Contravenções Penais pune não é o jogo em si, mas sim sua
exploração econômica. O que não se permite é explorar jogo alheio, como fazem
os cassinos. O simples fato de se jogar, mesmo que a dinheiro, é tolerado. Veja
o que diz a Lei de Contravenções Penais:
Decreto-Lei 3.688, de 3 de outubro de 1941:
jogo de azar em lugar público ou acessivel ao público, mediante o pagamento de
entrada ou sem ele:
meses a um ano, e multa, de dois a quinze contos de réis, estendendo-se os
efeitos da condenação à perda dos moveis e objetos de decoração do local.
terço, se existe entre os empregados ou participa do jogo pessoa menor de
dezoito anos.
duzentos mil réis a dois contos de réis, quem é encontrado a participar do
jogo, como ponteiro ou apostador.
§ 3º Consideram-se, jogos de
azar:
perda dependem exclusiva ou principalmente da sorte;
cavalos fora de hipódromo ou de local onde sejam autorizadas;
outra competição esportiva.
efeitos penais, a lugar acessível ao público:
realizam jogos de azar, quando deles habitualmente participam pessoas que não
sejam da família de quem a ocupa;
coletiva, a cujos hóspedes e moradores se proporciona jogo de azar;
sociedade ou associação, em que se realiza jogo de azar;
exploração de jogo de azar, ainda que se dissimule esse destino.
trata de um jogo de habilidade.
O Conjur noticia que muitos
campeonatos de “Texas Hold´em” (uma modalidade de pôquer), organizados pela
Confederação Brasileira de Texas Hold´em (CBHT) foram protelados graças a
liminares argumentando tratar-se de um jogo de azar. A exemplo disso, em 2010
não foi concedido alvará para realização de um campeonato de pôquer no Costão
do Santinho Resort & Spa, em Florianópolis. Tal negativa obrigou os
organizadores a entrarem com Mandado de Segurança na Câmara de Direito Público
do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, onde o torneio foi liberado (http://www.conjur.com.br/2012-jan-14/poquer-jogo-habilidade-nao-azar-entende-justica-catarinense).
Afirmou o Desembargador Relator Sérgio Roberto Luz em seu voto:
“Adianto, desde logo, que o pôquer não é jogo proibido porque não é de
azar, assim como também não é legalmente permitido, vale dizer, não há lei a
seu respeito, como existe em relação às diversas loterias, ou seja, trata-se
tão somente de um jogo não proibido. Por conseguinte, resta proibida a aposta
ou o jogo a dinheiro. Frisa-se, proibida é a aposta, não o jogo.
apostas em dinheiro, ou seja, para participar da competição o jogador paga uma
determinada quantia e recebe um número de fichas, com valores fictícios, sendo
vedada a aquisição de novas fichas ou apostas intervenientes. Sagra-se campeão
do torneio não aquele que possuir o maior número de fichas, mas aquele que
permanecer por último na mesa, verificando-se que o importante é não ser
eliminado.
inscrições de acordo com os lugares ocupados pelos concorrentes ao final da
competição.
questão pudesse envolver apostas ou jogo a dinheiro, o que seria defeso por
lei.
muito se assemelha aos nossos tradicionais campeonatos de dominó, onde os
participantes pagam uma taxa de inscrição, sendo vedada qualquer aposta
interveniente, e o prêmio para os vencedores é rateado conforme os valores
arrecadados.” (MS 2010.047810-1).
Pesou na decisão do desembargador
o fato do campeonato em questão não permitir apostas em dinheiro, ou seja, para
participar da competição o jogador paga uma determinada quantia e recebe um
número de fichas, com valores fictícios, sendo vedada a aquisição de novas
fichas ou apostas intervenientes. Disse o Relator:
“Sagra-se campeão do torneio não aquele que possuir o maior número de
fichas, mas aquele que permanecer por último na mesa, verificando-se que o
importante é não ser eliminado. A premiação, neste caso, é o rateio dos valores
arrecadados com as inscrições de acordo com os lugares ocupados pelos
concorrentes ao final da competição“. (MS 2010.047810-1).
Ao deferir a liminar, o
desembargador utilizou-se de parecer de Miguel
Reale Júnior para fundamentar sua decisão. Afirma trecho do parecer:
“Em suma, pode-se afirmar que no
jogo de pôquer ganha aquele que combina lógica e sensibilidade, lógica para
elaboração rápida de um juízo de probabilidades com as cartas abertas e o
número de jogadores, devendo também avaliar as desistências ocorridas, ao que
junta a necessidade de haver um poder de observação dos adversários e de saber
dissimular sua própria situação.
que, não só calcula as probabilidades, mas, também, sabe o momento certo
psicologicamente de “blefar” e vencer sem ter cartas para tanto, bem
como o que sabe o momento de se retirar diante da constatação de que o
adversário, por suas características, não está a blefar, mas aposta por possuir
cartas valiosas.
essencial para o sucesso no jogo de pôquer, especialmente em vista de ser um
contínuo de várias rodadas, não é a sorte, mas a habilidade sob diversos
aspectos, que vão do conhecimento matemático e das estratégias do jogo à
capacidade de observação dos demais e do poder de dissimulação.”(http://www.conjur.com.br/2012-jan-14/poquer-jogo-habilidade-nao-azar-entende-justica-catarinense)
Também contribuiu para o
resultado do julgamento, laudo elaborado pelo conhecido perito Ricardo Molina, no qual ele constata
que o quesito habilidade é decisivo nesse jogo e que o “blefador”, para saber o
momento certo de tentar a artimanha do blefe, deve: avaliar as cartas dos
oponentes; o padrão de reação dos mesmos; o tamanho do valor apostado; a sua
posição na mesa, pois quanto mais ao final da roda melhor para observar. Assim,
conclui o perito que a habilidade é decisiva para o sucesso, e não a sorte (http://www.conjur.com.br/2012-jan-14/poquer-jogo-habilidade-nao-azar-entende-justica-catarinense).
Vale ressaltar que o jogo de
pôquer, por não ser de azar, é tolerado, mas as apostas são proibidas, conforme
ressaltado neste julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
de azar, pois não depende exclusiva ou principalmente da sorte (DL 3.688/41,
art. 50, a), norma cujo rumo não pode ser invertido, como se dissesse que de
azar é o jogo cujo ganho ou perda não depende exclusiva ou principalmente da
habilidade. É o contrário. Diz que pode prevalecer é o fator sorte, e não que
deve prevalecer o fator habilidade.
fictício das cartas depende da habilidade do jogador, especialmente como observador
do comportamento do adversário, às vezes bastante sofisticado, extraindo daí
informações, que o leva a concluir se ele está, ou não, blefando. Não por acaso
costuma-se dizer que o jogador de pôquer é um blefador. Por sua vez, esse
adversário pode estar adotando certos padrões de comportamento, mas
ardilosamente, isto é, para também blefar. Por exemplo, estando bem, mostra-se
inseguro, a fim de o adversário aumentar a aposta, ou, estando mal, mostra-se
seguro, confiante, a fim de o adversário desistir. Em suma, é um jogo de
matemática e de psicologia comportamental.
CC, há jogo proibido, jogo não-proibido e jogo legalmente permitido, sendo que
apenas em relação a este a aposta é lícita. Considerando que o pôquer não é
jogo proibido porque não é de azar, e considerando que também não é legalmente
permitido, vale dizer, não há lei a seu respeito, como existe em relação às
diversas loterias, trata-se de jogo não-proibido; logo, proibida a aposta, o
jogo a dinheiro. Proibida é a aposta onerosa entre os jogadores, não o jogo.
onerosas, acontece atividade ilícita. O caso é de aposta ilícita, não de jogo
ilícito. Assim, se pretende continuar na ilicitude ou permitindo práticas
ilícitas, no mínimo de natureza civil, em seu recinto, óbvio que o fundado
receio não se baseia em ato injusto ou ilegal das autoridades, desmerecendo,
pois, a proteção via mandamus preventivo.
segurança denegado.
70025424086, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Irineu
Mariani, Julgado em 17/12/2008)
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro. Vol. 3.
Contratos e Atos Unilaterais. São Paulo: Saraiva, 8ª ed., 2011.
MENDONÇA, Camila Ribeiro de. Justiça de SC não entende pôquer como jogo
de azar. CONJUR. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2012-jan-14/poquer-jogo-habilidade-nao-azar-entende-justica-catarinense>.
Acesso em: 14/01/2012