Prestação dos serviços públicos
Os serviços públicos podem ser:
• prestados diretamente pelo Poder Público; ou
• transferidos temporariamente para
a iniciativa privada, por meio de um contrato de concessão ou de permissão.
Para que ocorra a concessão
ou permissão, é necessária a prévia realização de licitação?
SIM. Segundo o art. 175, da CF/88 e o art. 2º, II e IV, da
Lei nº 8.987/95, a concessão de serviço público deverá ser precedida de
licitação:
Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na
forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.
Art. 2º Para os fins do disposto nesta
Lei, considera-se:
(…)
II – concessão de serviço público: a
delegação de sua prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade concorrência ou diálogo
competitivo, a pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre
capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado;
(Redação dada pela Lei nº 14.133, de 2021)
(…)
IV – permissão de serviço público: a
delegação, a título precário, mediante licitação, da prestação
de serviços públicos, feita pelo poder concedente à pessoa física ou jurídica
que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco.
Art. 27 da Lei nº 8.987/95
A Lei nº 8.987/95 trata sobre a
concessão e permissão de serviços públicos.
O art. 27 da Lei nº 8.987/95 permite
que se transfira a concessão ou o controle societário da concessionária para
uma outra pessoa, desde que o poder público concorde e sejam respeitados os
requisitos legais.
Ex1: a empresa “X” venceu a
licitação para prestar determinado serviço público pelo prazo de 20 anos. Após
algum tempo, a concessão desse serviço é transferida para a empresa “Y”.
Ex2: a empresa “Z” venceu a
licitação para prestar determinado serviço público. Algum tempo depois, o
controle societário da empresa “Z” é transferido para outras pessoas diferentes
daquelas que havia no momento da licitação.
Confira a redação do dispositivo:
Art. 27. A transferência de concessão
ou do controle societário da concessionária sem prévia anuência do poder
concedente implicará a caducidade da concessão.
Parágrafo único. Para fins de obtenção
da anuência de que trata o caput deste artigo o pretendente deverá:
I – atender às exigências de capacidade
técnica, idoneidade financeira e regularidade jurídica e fiscal necessárias à
assunção do serviço; e
II – comprometer-se a cumprir todas as
cláusulas do contrato em vigor.
O Procurador-Geral da República
ajuizou ADI contra esse dispositivo alegando que essa transferência seria uma
forma de burlar a exigência de prévia licitação insculpida no art. 175 da
CF/88. Ora, quem venceu a licitação foi a empresa “X”, e não a empresa “Y”.
Além disso, o PGR argumentou que o dispositivo seria
contrário ao § 1º do art. 26 da mesma Lei, que estabelece que a subconcessão de
serviço público exige licitação:
Art. 26. É admitida a subconcessão, nos
termos previstos no contrato de concessão, desde que expressamente autorizada
pelo poder concedente.
§ 1º A outorga de subconcessão será
sempre precedida de concorrência.
(…)
O STF concordou com os argumentos
do PGR? O art. 27 da Lei nº 8.987/95 é inconstitucional?
NÃO.
O parágrafo único do art. 27
prevê que, mesmo com essa transferência, a base objetiva do contrato continuará
intacta. Permanecem o mesmo objeto contratual, as mesmas obrigações contratuais
e a mesma equação econômico-financeira. O que ocorre é apenas a sua modificação
subjetiva, seja pela substituição do contratado, seja em razão da sua reorganização
empresarial.
Em nosso sistema jurídico, o que
interessa à Administração é, sobretudo, a seleção da proposta mais vantajosa,
independentemente da identidade do particular contratado, ou dos atributos
psicológicos ou subjetivos de que disponha.
No tocante ao particular
contratado, basta que seja pessoa idônea, ou seja, que tenha comprovada
capacidade para cumprir as obrigações assumidas no contrato, o que também é
aferido por critérios objetivos e preestabelecidos.
O princípio constitucional da impessoalidade
veda que a Administração Pública tenha preferência por esse ou aquele
particular. Então, a identidade do particular contratado (ou do profissional de
reconhecida expertise vinculado a seu quadro de pessoal) não é relevante por si
mesma, devendo ser considerada apenas e tão somente na justa medida em que
representa o preenchimento dos requisitos objetivos e previamente definidos
previstos na lei e no edital.
Ademais, considerando a dinâmica
peculiar e complexa das concessões públicas, é natural que o próprio regime
jurídico das concessões contenha institutos que permitam aos concessionários se
ajustarem às adversidades da execução contratual com a finalidade de permitir a
continuidade da prestação dos serviços públicos e, sobretudo, a sua prestação
satisfatória ou adequada.
Se a lei exigisse a retomada do
serviço pelo poder público para só então fazer uma nova licitação, isso seria
contrário ao interesse público porque se mostraria muito demorado, além de
implicar custos altíssimos. Tudo isso resultaria, no final das contas, em
tarifas mais caras para os usuários.
As normas constitucionais que
estipulam a obrigatoriedade de licitação na outorga inicial da prestação de
serviços públicos a particulares não definem os exatos contornos do dever de licitar
(arts. 37, XXI, e 175, caput, da CF/88). Em palavras mais simples: a
Constituição exige a licitação, mas permite que o legislador ordinário tenha ampla
liberdade para disciplinar como será essa exigência à vista da dinamicidade e
da variedade das situações fáticas a serem abrangidas pela respectiva
normatização.
Vale ressaltar, por fim, que o
ato de transferência da concessão e do controle societário da concessionária,
nos termos do art. 27 da Lei nº 8.987/95, não se assemelha, em essência, à
subconcessão de serviço público, prevista no art. 26 do mesmo diploma,
justificando-se o tratamento legal diferenciado.
Em suma:
É
constitucional a transferência da concessão e do controle societário das
concessionárias de serviços públicos, mediante anuência do poder concedente (art.
27 da Lei nº 8.987/95).
STF.
Plenário. ADI 2946/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 8/3/2022 (Info 1046).
Com base nesse entendimento, o
Plenário do STF, por maioria, julgou improcedente o pedido formulado na ADI.
Cuidado com a doutrina
Existem inúmeros doutrinadores
que afirmam que esse art. 27 da Lei nº 8.987/95, na parte que autoriza a
transferência da concessão, seria inconstitucional. Nesse sentido: Celso
Antônio Bandeira de Mello e Maria Sylvia Di Pietro.
Chamo atenção para esse fato para
que tenham cuidado ao estudarem esses grandes autores e também como uma forma
de demonstrar conhecimento adicional caso seja cobrado em uma prova.