Olá amigos do Dizer o Direito,

O STF, após quase três anos,
aprovou no dia de ontem um novo enunciado de jurisprudência. Trata-se da Súmula
Vinculante n.° 33. Vamos
entender sobre o que ela trata?

SÚMULA VINCULANTE 33-STF:

Aplicam-se ao servidor público, no que
couber, as regras do Regime Geral de Previdência Social sobre aposentadoria
especial de que trata o artigo 40, parágrafo 4º, inciso III, da Constituição
Federal, até edição de lei complementar específica.

ENTENDENDO
O SENTIDO DA SV 33-STF:

O que é aposentadoria especial?

Aposentadoria especial é aquela cujos
requisitos e critérios exigidos do beneficiário são mais favoráveis que os
estabelecidos normalmente para as demais pessoas.

Quem tem direito à aposentadoria
especial no serviço público?

Quais servidores têm direito?

Onde estão previstos os requisitos e condições mais
favoráveis?

Professores exclusivos do magistério infantil e
dos ensinos fundamental e médio (art. 40, § 5º).

Na própria CF/88.

Servidores que sejam portadores de deficiência (art. 40, §
4º, I).

A CF exige que seja editada uma lei
complementar.

Servidores que exerçam atividades de risco
(art. 40, § 4º, II).

Servidores que exerçam atividades sob
condições especiais que prejudiquem
a saúde ou a integridade física
(art. 40, § 4º, III).

Logo, com exceção dos professores, a
CF/88 exige a edição de uma LEI COMPLEMENTAR definindo os critérios para a concessão
da aposentadoria especial aos servidores públicos. A Lei deverá, inclusive, elencar
as carreiras que se encontram em situação de risco ou cujas atividades
prejudiquem a saúde ou integridade física.

Essa lei complementar já foi editada?

NÃO.
O que acontece, já que não existe a LC?

Como ainda não há a referida lei complementar
disciplinando a aposentadoria especial do servidor público, o STF reconheceu
que o Presidente da República está em “mora legislativa” por ainda não ter
enviado ao Congresso Nacional o projeto de lei para regulamentar o art. 40, §
4º, III da CF/88.

Diante disso, o STF, ao julgar o Mandado
de Injunção n.° 721/DF
(e vários outros que foram ajuizados depois), determinou que, enquanto não for
editada a LC regulamentando o art. 40, § 4º, III, da CF/88, deverão ser aplicadas,
aos servidores públicos, as regras de aposentadoria especial dos trabalhadores
em geral (regras do Regime Geral de Previdência Social – RGPS), previstas no
art. 57 da Lei nº 8.213/91.

Assim, se o servidor público exerce
suas atividades em condições insalubres, poderá requerer aposentadoria especial
e a Administração Pública deverá analisar o requerimento com base nos
requisitos do RGPS trazidos pelo art. 57 da Lei n.° 8.213/91. Veja o que diz a referida
Lei:

Art. 57. A aposentadoria especial será
devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver
trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos,
conforme dispuser a lei.

§ 1º A aposentadoria especial,
observado o disposto no art. 33 desta Lei, consistirá numa renda mensal
equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício.

Logo, os servidores públicos que
exerçam atividades sob condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou
integridade física (art. 40, § 4º, III da CF/88) terão direito de se aposentar
com menos tempo de contribuição que os demais agentes públicos.

Ex: a CF/88 prevê que o servidor homem
possa se aposentar, voluntariamente, com 60 anos de idade e 35 anos de
contribuição (art. 40, § 1º, III, a
da CF/88). No entanto, se o servidor público tiver trabalhado durante 25 anos
sob condições insalubres, poderá ter direito à aposentadoria especial, nos
termos do art. 40, § 4º, III da CF c/c o art. 57 da Lei nº 8.213/91.

Vale ressaltar que a SV 33-STF
somente trata sobre a aposentadoria especial do servidor público baseada no
inciso III do § 4º do art. 40 da CF/88 (atividades sob condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física), não abrangendo as hipóteses do
incisos I (deficientes) e II (atividades de risco).

Em rápidas linhas, é esse o sentido da
SV 33-STF.

Espero que eu tenha conseguido me
desincumbir do dever de ser claro e que você tenha entendido, mas reconheço que
não é um assunto fácil.

Agora, se você quiser/precisar
aprofundar um pouco mais o tema, continue lendo abaixo. Faço, porém, um alerta: vai ficar
mais difícil.

APROFUNDANDO O TEMA:

As regras do RGPS aplicam-se aos
servidores públicos apenas “no que couber”

A SV 33-STF afirma expressamente
que as regras do RGPS sobre aposentadoria especial aplicam-se ao servidor
público, no que couber.
Em outras palavras, nem todas as normas do RGPS serão cabíveis para a
aposentadoria especial do servidor público.

Um importante exemplo de regra
que é válida para a aposentadoria especial no RGPS, mas não se aplica aos
servidores públicos é a CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM TEMPO COMUM.

Imagine a seguinte situação:

A lei prevê a aposentadoria especial
para aqueles que trabalharam durante 25 anos em condições insalubres.

Maria trabalhou, em uma empresa
privada, durante 20 anos em atividades especiais (trabalho exposto a radiação)
e 6 anos em atividade comum (não insalubres). Logo, não terá direito à aposentadoria especial,
que exige 25 anos de atividades especiais para o caso de radiação (item 1.1.4
do Decreto nº 53.831/64).

Poderá ela somar os 20 anos de
atividades insalubres com os 6 anos de atividades comuns?
SIM.

Ao converter estes 20 anos de
atividades especiais em tempo de atividades comuns, haverá algum tipo de acréscimo
(contagem de tempo diferenciada)?

SIM. O tempo de trabalho exercido sob
condições especiais consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será
convertido em “tempo comum” (exercido em atividade comum) e nesta conversão vão
ser aplicados alguns índices matemáticos que farão com que o tempo se torne
maior. Ex: 20 anos = 7.300 dias de tempo comum. No entanto, como esses 20 anos
foram prestados em atividade especial, para serem convertidos em tempo comum,
eles devem ser multiplicados por 1,2. Assim, teremos 7.300 x 1,2 = 8.760.

Logo, 7.300 dias trabalhados sob o
regime especial podem se transformar em 8.760 dias caso este período de tempo
especial seja convertido em tempo comum.

No exemplo que demos acima, Maria
trabalhou 20 anos (7.300 dias) em atividades especiais e 6 anos (2.190 dias) em
atividade comum. Logo, não conseguirá a aposentadoria especial (que exige 25
anos de atividade especial).

Maria irá, então,
somar os períodos para ver se consegue a aposentadoria comum (não especial).

Os 7.300 dias trabalhados irão
virar 8.760 dias.

Dessa forma, ela irá somar 8.760
+ 2.190
= 10.950 dias (30 anos) para fins de aposentadoria.

Onde está previsto este índice de
conversão de 1,20?

Os índices de conversão de “tempo
especial” em “tempo comum” estão previstos no art. 70 do Decreto nº 3.048/99.
Ressalte-se que há outros índices, além deste de 1,20 e eles irão variar de
acordo com a atividade especial (obs: há muitas polêmicas sobre isso, mas elas
não interessam para o que estamos discutindo aqui).

Feitos os esclarecimentos acima,
indaga-se: os servidores públicos que exerçam atividades sob condições
especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (art. 40, § 4º, III
da CF/88) podem se valer destes índices para fazer a conversão do “tempo
especial” trabalhado em “tempo comum”?

NÃO. O STF afirmou que não se extrai da
norma contida no art. 40, § 4º, III da CF/88 que exista o dever constitucional de
que o Presidente da República e o Congresso Nacional editem uma lei, em favor
dos servidores públicos, prevendo contagem diferenciada para quem trabalhou
parte de sua vida em atividades insalubres e, ao final, averbe (registre e
some) este período de forma maior para fins de aposentadoria.

Em outras palavras, para o STF, o art.
40, § 4º, III não garante necessariamente aos servidores este direito à
conversão com contagem diferenciada de tempo especial em tempo comum. O que
este dispositivo garante é apenas o direito à “aposentadoria especial” (com
requisitos e critérios diferenciados).

Dessa feita, não se pode aplicar as
regras de conversão do tempo especial em tempo comum, previstas para os trabalhadores
em geral (RGPS), para os servidores públicos, considerando que a lei que vier a
ser editada regulamentando o art. 40, § 4º, III da CF/88 não estará obrigada a
conceder este fator de conversão aos servidores. Foi assim que decidiu o STF. Confira:

(…) A concessão do mandado de injunção, na hipótese do art. 40, § 4º, da Lei Fundamental, reclama a demonstração pelo Impetrante do preenchimento dos requisitos para a aposentadoria especial e a impossibilidade in concrecto de usufruí-la ante a ausência da norma regulamentadora. 
2. O alcance da decisão proferida por esta Corte, quando da integração legislativa do art. 40, § 4º, inciso III, da CRFB/88, não tutela o direito à contagem diferenciada do tempo de serviço prestado em condições prejudiciais à saúde e à integridade física. 
3. Não tem procedência injuncional o reconhecimento da contagem diferenciada e da averbação do tempo de serviço prestado pelo Impetrante em condições insalubres por exorbitar da expressa disposição constitucional. Precedentes. (…)
STF. Plenário. MI 3788 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 24/10/2013.

Daí, o enunciado da SV 33 dizer,
corretamente, que aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do RGPS.

INFORMAÇÃO ADICIONAL: APOSENTADORIA ESPECIAL DE DEFICIENTE E LC
142/2013

A SV 33-STF somente trata sobre a
aposentadoria especial do servidor público baseada no inciso III do § 4º do
art. 40 da CF/88 (atividades sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou
a integridade física).

Infelizmente, as hipóteses de
aposentadoria especial de servidores deficientes (inciso I) e que exercem
atividades de risco (inciso II) não foram objeto da SV.

Vale ressaltar que, no dia
09/11/2013, entrou em vigor a LC 142/2013, regulamentando o § 1º do art. 201 da
CF/88 no tocante à aposentadoria da pessoa com deficiência segurada do RGPS.

Em princípio, o regime jurídico
da LC 142/2013 não se aplicaria aos servidores públicos, porque a referida Lei
é restrita ao RGPS (trabalhadores em geral, filiados ao regime administrado
pelo INSS). No entanto, como a Lei Complementar de que trata o art. 40, § 4º, I, da CF/88 ainda não foi
editada, o STF, em um mandado de injunção, reconheceu que o Presidente da
República está em “mora legislativa” por ainda não ter enviado ao Congresso
Nacional o projeto de lei para regulamentar o art. 40, § 4º, I da CF/88 (aposentadoria
especial para servidores deficientes). Com base nisso, determinou que sejam aplicadas aos servidores
públicos portadores de deficiência os critérios e condições previstos nesta LC
142/2013
. Nesse sentido: STF MI 5126-DF, DJe 02/10/2013.

Vale ressaltar que esse tema (e
muitos outros) foram explicados, com detalhes, no Livro Principais Julgados de 2013 do STF e
STJ comentados.

Um grande abraço a todos.

Márcio André Lopes Cavalcante

Professor

Artigo Original em Dizer o Direito

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