Competência da JF para julgar os crimes contra a
organização do trabalho

Segundo o art. 109, VI, da CF/88, compete aos juízes
federais processar e julgar:

VI – os crimes contra a organização do
trabalho
e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro
e a ordem econômico-financeira;

O Título IV do Código Penal, que engloba os arts.
197 a 207, possui a seguinte rubrica: “Dos crimes contra a organização do
trabalho”. Diante disso, indaga-se: os crimes contra a organização do trabalho
previstos neste Título IV do CP serão sempre julgados pela Justiça Federal?

NÃO. Segundo entende o STJ, os crimes previstos nos
arts. 197 a 207 do CP somente serão de competência da Justiça Federal quando
ficar demonstrado, no caso concreto, que o delito provocou lesão a:

• direito dos trabalhadores coletivamente
considerados; ou

• organização geral do trabalho.

Como exemplo, o art. 203 do CP prevê como crime “frustrar, mediante fraude ou violência,
direito assegurado pela legislação do trabalho”
. O STJ já decidiu que, se o
art. 203 foi perpetrado em detrimento de apenas um trabalhador, compete à
Justiça Estadual processar e julgar o feito (CC 108.867/SP, DJe de 19/4/2010).

De igual modo, o delito de sabotagem industrial
(art. 202 do CP), apesar de estar no Título IV, que trata dos crimes contra a
organização do trabalho, deve ser julgado pela Justiça estadual se atingir
apenas bens particulares sem repercussão no interesse da coletividade (STJ. CC
123.714-MS, julgado em 24/10/2012).

O STF possui entendimento semelhante. Para a Corte,
somente são da competência da Justiça Federal os crimes contra a organização do
trabalho (arts. 197 a 207 do CP) quando causarem prejuízo à ordem pública,
econômica ou social e ao trabalho coletivo (RE 599943 AgR, Relator Min. Cármen
Lúcia, Primeira Turma, julgado em 02/12/2010).

Em outro julgado, o Pretório Excelso afirmou que a
interpretação do que seja crime contra a organização do trabalho, para o fim
constitucional de determinar a competência, não se junge à capitulação do
Código Penal. Assim, se no caso concreto, houve retenção momentânea, mediante
violência, de um único empregado, impedido de adentrar à empresa onde laborava,
verifica-se ofensa à liberdade individual e não à organização do trabalho como
um todo. Logo, a competência, nessa hipótese, é da Justiça estadual (ARE 706368
AgR, Relator Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, julgado em 30/10/2012).

Em resumo, os delitos previstos nos arts. 197 a 207
do CP poderão ser de competência da Justiça Federal ou da Justiça Estadual, a
depender do caso concreto.

Vamos tratar agora do
crime de redução a condição análoga à de escravo, previsto no art. 149 do CP. De
quem é a competência para julgar esse delito?

Justiça FEDERAL. Compete
à justiça federal processar e julgar o crime de redução à condição análoga à de
escravo (art. 149 do CP).

STF. Plenário. RE
459510/MT, rel. orig. Min. Cezar Peluso, red. p/ o acórdão Min. Dias Toffoli,
julgado em 26/11/2015 (Info 809).

Este crime encontra-se encartado no Título I do
Código Penal, que trata sobre os “crimes contra a pessoa” e não no Título IV
(“Dos crimes contra a organização do trabalho”). Apesar disso, o STF entende
que se trata de delito de competência da Justiça Federal, tendo em vista que a
topografia do crime (ou seja, sua posição no Código Penal) não é o fator
preponderante no momento da fixação da competência.

Como explica o Min. Joaquim Barbosa:

A
Constituição, no art. 109, VI, determina que são da competência da Justiça
Federal ‘os crimes contra a organização do trabalho’, sem explicitar que
delitos se incluem nessa categoria. Embora no Código Penal brasileiro haja um
capítulo destinado a tais crimes, o entendimento doutrinário e jurisprudencial
dominante é no sentido de que não há correspondência taxativa entre os delitos
capitulados no referido Código e aqueles indicados na Constituição, cabendo ao
intérprete verificar em quais casos se está diante de um ‘crime contra a
organização do trabalho’.
(RE
398.041-6).

No mesmo sentido, veja as palavras do Min. Gilmar
Mendes:

Com
efeito, o art. 109, VI, da Constituição Federal estabelece a competência da
Justiça Federal para julgar os crimes contra a organização do trabalho. Contudo,
a Lei Maior não se interpreta a partir do Código Penal e o nomen iuris de um
capítulo do Diploma Penal não tem o condão de definir a natureza jurídica de um
delito, tampouco sua objetividade jurídica.
(ARE 706368 AgR / SP)

Em suma, é possível encontrar
crimes definidos no Título IV do Código Penal que não correspondem à norma
constitucional do art. 109, VI, também sendo certo que outros crimes definidos
na legislação podem configurar, dependendo do caso, crime contra a organização
do trabalho (STF. ARE 706368 AgR / SP)

O Plenário do STF, no julgamento do RE 398.041 (rel.
Min. Joaquim Barbosa, sessão de 30.11.2006), fixou a competência da Justiça
Federal para julgar os crimes de redução à condição análoga à de escravo, por
entender “que quaisquer condutas que
violem não só o sistema de órgãos e instituições que preservam, coletivamente,
os direitos e deveres dos trabalhadores, mas também o homem trabalhador,
atingindo-o nas esferas em que a Constituição lhe confere proteção máxima,
enquadram-se na categoria dos crimes contra a organização do trabalho, se
praticadas no contexto de relações de trabalho”
(RE 541627, Relatora
Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, julgado em 14/10/2008).

No mesmo sentido entende o STJ:

(…) A Terceira Seção desta Corte já pacificou o
entendimento de que compete à Justiça Federal processar e julgar os autores do
delito previsto no art. 149 do Código Penal, haja vista a violação aos direitos
humanos e à organização do trabalho. (…)

(STJ. 6ª Turma. RHC 25.583/MT, Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, julgado em 09/08/2012)

Artigo Original em Dizer o Direito

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