Ordem dos processos nos Tribunais

Os arts. 929 a 946 trazem regras
prevendo como serão os julgamentos dos processos nos Tribunais.

Esses dispositivos disciplinam
tanto os processos originários como os recursos a serem julgados pelos
Tribunais.

Princípio da colegialidade das
decisões dos Tribunais

Nos tribunais, os processos que
lá tramitam devem ser julgados, em regra, por um grupo de magistrados, cada um
dando o seu voto sobre o tema, de forma que a decisão será o entendimento
firmado pela maioria (ou unanimidade) dos julgadores. Trata-se do princípio da
colegialidade das decisões dos Tribunais.

Relator

Em todo processo que tramita em
Tribunal, será sorteado um julgador que exercerá a função de “relator”.

O “relator” será o magistrado que
irá ter contato inicial e mais direto com os autos. O processo irá ser
distribuído para seu gabinete e lá ele preparará um relatório sobre o caso e o
seu voto. O relator poderá também requerer diligências, decidir pedidos de urgência,
entre outras atribuições previstas no Regimento Interno do Tribunal.

Atribuições do Relator

O art. 932 do
CPC prevê as atribuições do Relator. Vale a pena conhecer:

Art. 932.  Incumbe ao relator:

I – dirigir e ordenar o processo no
tribunal, inclusive em relação à produção de prova, bem como, quando for o
caso, homologar autocomposição das partes;

II – apreciar o pedido de tutela
provisória nos recursos e nos processos de competência originária do tribunal;

III – não conhecer de recurso inadmissível,
prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da
decisão recorrida;

IV – negar provimento a recurso que
for contrário a:

a) súmula do Supremo Tribunal Federal,
do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;

b) acórdão proferido pelo Supremo
Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos
repetitivos;

c) entendimento firmado em incidente
de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;

V – depois de facultada a apresentação
de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for
contrária a:

a) súmula do Supremo Tribunal Federal,
do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;

b) acórdão proferido pelo Supremo
Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos
repetitivos;

c) entendimento firmado em incidente
de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;

VI – decidir o incidente de
desconsideração da personalidade jurídica, quando este for instaurado
originariamente perante o tribunal;

VII – determinar a intimação do
Ministério Público, quando for o caso;

VIII – exercer outras atribuições
estabelecidas no regimento interno do tribunal.

Parágrafo único. Antes de considerar
inadmissível o recurso, o relator concederá o prazo de 5 (cinco) dias ao
recorrente para que seja sanado vício ou complementada a documentação exigível.

Voto do Relator

Após estudar o processo, o
Relator irá preparar o seu “voto”.

O voto é a análise jurídica feita
pelo Desembargador (se for em TJ/TRF) ou Ministro (em caso de Tribunais
Superiores) a respeito daquele processo.

Inclusão em pauta

Depois que o
Relator concluir o seu voto, ele deverá devolver os autos à Secretaria do
Tribunal e esse processo estará pronto para ser “pautado”, ou seja, já poderá
ser marcada uma data para este processo ser julgado pelo colegiado.

Art. 931. Distribuídos, os autos serão
imediatamente conclusos ao relator, que, em 30 (trinta) dias, depois de
elaborar o voto, restituí-los-á, com relatório, à secretaria.

Obs: o prazo do art. 931 é
impróprio, ou seja, o seu descumprimento não gera consequências processuais.

Presidente do colegiado faz a
pauta

Quem faz a
pauta, isto é, quem define o dia em que o processo será levado a julgamento é o
presidente do colegiado:

Art. 934. Em seguida, os autos serão
apresentados ao presidente, que designará dia para julgamento, ordenando, em
todas as hipóteses previstas neste Livro, a publicação da pauta no órgão
oficial.

Art. 935. Entre a data de publicação
da pauta e a da sessão de julgamento decorrerá, pelo menos, o prazo de 5
(cinco) dias, incluindo-se em nova pauta os processos que não tenham sido
julgados, salvo aqueles cujo julgamento tiver sido expressamente adiado para a
primeira sessão seguinte.

§ 1º Às partes será permitida vista
dos autos em cartório após a publicação da pauta de julgamento.

§ 2º Afixar-se-á a pauta na entrada da
sala em que se realizar a sessão de julgamento.

Ordem
de julgamento

Art. 936. Ressalvadas as preferências
legais e regimentais, os recursos, a remessa necessária e os processos de
competência originária serão julgados na seguinte ordem:

I – aqueles nos quais houver
sustentação oral, observada a ordem dos requerimentos;

II – os requerimentos de preferência
apresentados até o início da sessão de julgamento;

III – aqueles cujo julgamento tenha
iniciado em sessão anterior; e

IV – os demais casos.

Análise do voto do relator na
sessão de julgamento

A conclusão exposta no voto do
Relator não irá, necessariamente, prevalecer. Isso porque os demais magistrados
que compõe o colegiado poderão, durante a sessão de julgamento, discordar e
apresentar votos em sentido diferente.

Assim, o Relator irá ler o seu
voto e os demais membros do colegiado irão dizer se concordam ou não com as
conclusões expostas.

O resultado do julgamento pode
ser unânime (quando todos os membros do colegiado concordam entre si) ou por
maioria (quando no mínimo um magistrado discorda dos demais).

O que irá prevalecer é a posição
da maioria (ou unanimidade).

Resultado do julgamento

Proferidos os votos, o presidente
do colegiado anunciará o resultado do julgamento:

Ex1: a 2ª Câmara Cível do
Tribunal de Justiça, por unanimidade, nos termos do voto do Desembargador
Relator Raimundo Nonato, deu provimento à apelação.

Ex2: a 8ª Turma do Tribunal
Regional Federal da 1ª Região, por maioria, nos termos do voto do Desembargador
Federal Júlio Verne, negou provimento ao agravo de instrumento. Ficou vencida a
Desembargadora Federal Maria Esther de Bueno, que dava provimento ao agravo de
instrumento.

Ex3: a 1ª Câmara Cível do
Tribunal de Justiça, por maioria, vencido o Relator, não conheceu da apelação. Lavrará
o acórdão o Desembargador Francisco Silva.

Desse modo, o presidente anuncia
o resultado do julgamento e informa se:

• o voto do Relator foi
acompanhado pela maioria ou unanimidade do colegiado (situação na qual ele
redigirá o acórdão); ou

• se o Relator ficou vencido indicando,
neste caso, qual será o magistrado que irá redigir o acórdão no lugar do Relator.
Talvez você já tenha visto um acórdão com essa situação. Fica registrado assim:
“Redator para acórdão Desembargador/Ministro Fulano de Tal”.

Redator para acórdão

Caso o Relator tenha sido vencido
(seu voto não foi acompanhado pelos demais), o Redator para o acórdão será o
Desembargador/Ministro que, depois de que o Relator apresentou seu voto, foi o
primeiro a discordar, apresentando posição divergente.

Veja o que
diz o CPC:

Art. 941.  Proferidos os votos, o presidente anunciará o
resultado do julgamento, designando para redigir o acórdão o relator ou, se
vencido este, o autor do primeiro voto vencedor.

Voto vencido deve constar no acórdão

Como vimos acima, o resultado do
julgamento pode ser:

• por unanimidade (quando todos
os membros do colegiado concordam entre si); ou

• por maioria (quando no mínimo
um magistrado discorda dos demais).

Se for por
maioria, o(s) voto(s) vencido(s) deve(m) constar obrigatoriamente no acórdão. É
o que determina o § 3º do art. 941 do CPC:

Art. 941 (…)

§ 3º O voto vencido será
necessariamente declarado e considerado parte integrante do acórdão para todos
os fins legais, inclusive de pré-questionamento.

Assim, segundo o CPC/2015, o
acórdão é composto pela totalidade dos votos, ou seja, não apenas os votos
vencedores, mas também os vencidos. (FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima. Da ordem do processo nos tribunais. In:
WAMBIER, Teresa et al. Breves comentários ao Código de Processo Civil. São
Paulo: RT, 2015. p. 2.101)

Fundamentação das decisões
judiciais

O § 3º do art. 941 do CPC existe
para que o Poder Judiciário cumpra o seu dever de fundamentar as decisões
judiciais (art. 93, IX, da CF/88), observando o devido processo legal.

Este dispositivo tem uma
importância endo e exraprocessual.

• Sob o ponto de vista
endoprocessual, o § 3º do art. 941 garante às partes o conhecimento integral do
debate prévio ao julgamento, permitindo o exercício pleno da ampla defesa;

• Sob o aspecto extraprocessual,
esta norma confere à sociedade o poder de controlar a atividade jurisdicional,
assegurando a independência e a imparcialidade do órgão julgador.

A publicação do(s) voto(s)
vencido(s) permite que a comunidade jurídica possa conhecer outros fundamentos
diversos daquele que prevaleceu. Assim, embora os argumentos do voto vencido
não constituam a razão de decidir (ratio
decidendi
) do colegiado, eles têm o condão de instigar e ampliar a
discussão acerca das questões julgadas pelas Cortes brasileiras e pode,
inclusive, sinalizar uma forte tendência do tribunal à mudança de
posicionamento.

Função atribuída ao voto vencido

Fredie Didier
aponta as finalidades do voto vencido:

“a) Ao se
incorporar ao acórdão, o voto vencido agrega a argumentação e as teses
contrárias àquela que restou vencedora; isso ajuda no desenvolvimento judicial
do Direito, ao estabelecer uma pauta a partir da qual se poderá identificar, no
futuro, a viabilidade de superação do precedente (art. 489, § 1º, VI, e art.
927, §§ 2º, 3º, e 4º, CPC).

b) O voto
vencido, por isso, funciona como uma importante diretriz na interpretação da
ratio decidendi vencedora: ao se conhecer qual posição se considerou como
vencida fica mais fácil compreender, pelo confronto e pelo contraste, qual tese
acabou prevalecendo no tribunal. Por isso, o voto vencido ilumina a compreensão
da ratio decidendi.

c) Além disso,
o voto vencido demonstra a possibilidade de a tese vencedora ser revista mais
rapidamente, antes mesmo de a ela ser agregada qualquer eficácia vinculante, o
que pode fragilizar a base da confiança, pressuposto fático indispensável à
incidência do princípio da proteção da confiança (…). O voto vencido mantém a
questão em debate, estimulando a comunidade jurídica a discuti-la.

d) Note,
ainda, que a inclusão do voto vencido no acórdão ratifica regra imprescindível
ao microssistema de formação concentrada de precedentes obrigatórios: a
necessidade de o acórdão do julgamento de casos repetitivos reproduzir a
íntegra de todos os argumentos contrários e favoráveis à tese discutida.” (arts.
984, § 2º, e 1.038, § 3º, CPC). (Curso de Direito Processual Civil. V. 3. 15ª
ed. Salvador: JusPodivm, 2018. p. 47)

Há nulidade do acórdão e
do julgamento caso o § 3º do art. 941 do CPC seja descumprido? Há nulidade
se o voto vencido não tiver sido juntado ao acórdão?

• Haverá nulidade do acórdão.

• Não haverá nulidade do
julgamento (salvo se o resultado proclamado não refletir a vontade da maioria).

A inobservância da regra do § 3º
do art. 941 do CPC constitui vício de atividade ou erro de procedimento (error
in procedendo
). Isso porque se trata de um vício não relacionado com o teor
do julgamento em si, mas sim com a condução do procedimento de lavratura e
publicação do acórdão.

O acórdão representa apenas a
materialização do julgamento.

Assim, haverá a nulidade do
acórdão (por não conter a totalidade dos votos declarados). No entanto, o
simples descumprimento do § 3º do art. 941 não gera a nulidade do julgamento,
se o resultado proclamado refletir, com exatidão, a conjunção dos votos proferidos
pelos membros do colegiado.

O que significa isso, na prática?

Significa que, se o STJ
reconhecer que o TJ ou TRF descumpriu o § 3º do art. 941, ele deverá:

• anular o acórdão proferido e

• determinar que o TJ ou TRF
promova a republicação do acórdão após a juntada do(s) voto(s) vencido(s).

Por outro lado, não será
necessário um novo julgamento, salvo se ficar demonstrado que, além de
descumprir o § 3º do art. 941, houve vício no próprio julgamento, ou seja, a
tese vencedora não foi aquela que constou como majoritária.

Resumindo:

O
§ 3º do art. 941 do CPC/2015 prevê que:

§
3º O voto vencido será necessariamente declarado e considerado parte integrante
do acórdão para todos os fins legais, inclusive de pré-questionamento.


nulidade do acórdão e do julgamento caso o § 3º do art. 941 do CPC seja
descumprido? Há nulidade se o voto vencido não tiver sido juntado ao acórdão?


Haverá nulidade do acórdão.


Não haverá nulidade do julgamento (salvo se o resultado proclamado não refletir
a vontade da maioria).

Em
suma: haverá nulidade do acórdão que não contenha a totalidade dos votos
declarados; por outro lado, não haverá nulidade do julgamento, se o resultado
proclamado refletir, com exatidão, a conjunção dos votos proferidos pelos
membros do colegiado.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.729.143-PR, Rel.
Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/02/2019 (Info 642).

Artigo Original em Dizer o Direito

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