Filiação partidária

No Brasil, a pessoa somente pode concorrer a um cargo
eletivo se estiver filiada a um partido político. Isso porque a Constituição
Federal exige, como um dos requisitos de elegibilidade, a filiação partidária:

Art. 14 (…)

§ 3º São condições de elegibilidade, na
forma da lei:

(…)

V – a filiação partidária;

 

No mesmo sentido é o Código Eleitoral:

Art. 87. Somente podem concorrer às
eleições candidatos registrados por partidos.

 

 

O partido pode registrar
quantos candidatos quiser para concorrer à eleição ou existe um limite?

Existe um limite estipulado pelo art. 10 da Lei nº 9.504/97:

Art. 10. Cada partido poderá registrar
candidatos para a Câmara dos Deputados, a Câmara Legislativa, as Assembleias
Legislativas e as Câmaras Municipais no total de até 100% (cem por cento) do
número de lugares a preencher mais 1 (um). (Redação dada pela Lei nº 14.211/2021)

                                                                                                                          

Assim, por exemplo, se a Câmara do
Município “X” é composta por 9 Vereadores, cada partido poderá registrar, no
máximo, 10 candidatos daquela agremiação ao cargo de Vereador.

 

No partido, geralmente,
existem mais pessoas interessadas em concorrer do que a quantidade de vagas que
são disponíveis. Ex: são 10 vagas para o cargo de Vereador e existem 20
interessados. Como o partido escolhe, dentre os filiados interessados, quais
serão aqueles que irão concorrer representando o partido na eleição?

O partido faz essa escolha com base em critérios definidos
em seu estatuto. É o que diz o art. 7º da Lei nº 9.504/97:

Art. 7º As normas para a escolha e
substituição dos candidatos e para a formação de coligações serão estabelecidas
no estatuto do partido, observadas as disposições desta Lei.

 

Formalmente, essa escolha é feita
em um ato denominado convenção partidária, que deve ocorrer no período de 20 de julho a
5 de agosto do ano da eleição (art. 8º, da Lei nº 9.504/97).

Na prática, esses candidatos são
escolhidos antes e a convenção partidária serve apenas para formalizar isso e
anunciar os nomes para a imprensa e público em geral.

 

O indivíduo que já ocupa o
cargo eletivo e vai em busca da reeleição possui o direito subjetivo de ser
escolhido pelo partido como candidato? Ex: João, filiado ao Partido “X”, já é
vereador; ele deseja concorrer à reeleição; pelo fato de já ser vereador, o Partido
“X” é obrigado a escolher João como sendo um dos candidatos da agremiação?

NÃO.

O legislador tentou impor essa obrigatoriedade no § 1º do
art. 8º da Lei nº 9.504/97:

Art. 8º A escolha dos candidatos pelos
partidos e a deliberação sobre coligações deverão ser feitas no período de 20
de julho a 5 de agosto do ano em que se realizarem as eleições, lavrando-se a
respectiva ata em livro aberto, rubricado pela Justiça Eleitoral, publicada em
vinte e quatro horas em qualquer meio de comunicação. (Redação dada pela
Lei nº 13.165/2015)

§ 1º Aos detentores de mandato de
Deputado Federal, Estadual ou Distrital, ou de Vereador, e aos que tenham
exercido esses cargos em qualquer período da legislatura que estiver em curso, é assegurado o registro de candidatura para o mesmo cargo pelo partido a
que estejam filiados
.

(…)

 

Isso foi denominado pela doutrina
e jurisprudência de “candidatura nata”.

Assim, “candidatura nata” é o direito
que o titular do mandato eletivo possui de, obrigatoriamente, ser escolhido e
registrado pelo partido político como candidato à reeleição.

 

A previsão do § 1º do art.
8º da Lei nº 9.504/97 é constitucional? O instituto da candidatura nata é
compatível com a CF/88?

NÃO.

O
instituto da “candidatura nata” é incompatível com a Constituição Federal de
1988, tanto por violar a isonomia entre os postulantes a cargos eletivos como,
sobretudo, por atingir a autonomia partidária (art. 5º, “caput” e art. 17 da
CF/88).

STF.
Plenário. ADI 2530/DF, Rel. Min. Nunes Marques, julgado em 18/8/2021 (Info
1026).

 

A denominada “candidatura nata” —
entendida como um direito potestativo de detentor de mandato eletivo à
indicação pelo partido para as próximas eleições, independentemente de
aprovação em convenção partidária — é absolutamente incompatível com a atual
atmosfera de liberdade de ação partidária.

A imunização pura e simples do
detentor de mandato eletivo contra a vontade colegiada do partido acaba sendo
um privilégio completamente injustificado, que contribui tão só para a
perpetuação de ocupantes de cargos eletivos, em detrimento de outros pré-candidatos,
sem qualquer justificativa plausível para o funcionamento do sistema
democrático, e sem que haja meios para que o partido possa fazer imperar os
objetivos fundamentais inscritos no seu estatuto.

Num contexto em que a fidelidade
partidária é um princípio fundamental da dinâmica dos partidos políticos,
especialmente no que diz respeito aos titulares de cargos eletivos obtidos pelo
sistema proporcional, cabe ao candidato submeter-se à vontade coletiva do
partido, e não o contrário.

A “candidatura nata” contrasta
profundamente com esse postulado e, por esse aspecto, esvazia toda a ideia de
fidelidade partidária em favor de um suposto “direito adquirido” à candidatura
dos detentores de mandato eletivo pelo sistema proporcional.

Com base nesse entendimento, o
Plenário julgou procedente o pedido formulado para declarar a
inconstitucionalidade do § 1º do art. 8º da Lei 9.504/1997, com modulação dos
efeitos da declaração de inconstitucionalidade.

                                                   

Essa decisão consiste em uma
novidade?

NÃO.

Essa ADI foi proposta em setembro
de 2001 e, em abril de 2002, o STF concedeu medida cautelar para suspender a
eficácia do § 1º do art. 8º da Lei nº 9.504/97.

Assim, desde essa data, esse
dispositivo não estava produzindo efeitos e não existia o instituto da
candidatura nata no Brasil.

STF. Plenário. ADI 2530 MC, Rel.
Min. Sydney Sanches, julgado em 24/04/2002.

 

Uma última curiosidade que pode estar afligindo alguns
leitores: se o detentor do mandato souber que não será escolhido pelo partido,
ele poderá migrar para outra agremiação sem perder o mandato acusado de
infidelidade partidária?

Em se tratando de ocupante de cargo do sistema
majoritário (Prefeito, Governador, Senador ou Presidente), a situação é mais
simples. Isso porque não se exige fidelidade partidária no caso do sistema
majoritário (art. 17, § 6º da CF/88) (Súmula 67-TSE). Logo, é possível que ele
troque de partido sem perder o mandato, desde que o faça até 6 meses antes do
pleito, pois esse é o período mínimo de filiação exigido para registro de
candidatura.

Já para o ocupante de cargo do sistema proporcional
(Vereador, Deputado Estadual e Deputado Federal), a lei faculta ao parlamentar
trocar de partido sem perda de mandato dentro do período denominado “janela
partidária”.

Como já mencionado anteriormente, a lei exige um prazo
mínimo de 6 meses de filiação para que alguém possa concorrer a cargo público.
Nos 30 dias imediatamente anteriores a esse prazo mínimo de filiação, abre-se
aos detentores de mandato a possibilidade de mudança de partido sem
consequências jurídicas (perda de mandato).

A esse período dá-se o nome de “janela partidária”. Trata-se
de uma hipótese em que a justa causa para desfiliação é presumida. Ela está
expressamente prevista no art. 22-A, parágrafo único, III, da Lei nº 9.096/95:

Art. 22-A.  Perderá o mandato o detentor de cargo eletivo
que se desfiliar, sem justa causa, do partido pelo qual foi eleito.

Parágrafo único.  Consideram-se justa causa para a desfiliação
partidária somente as seguintes hipóteses:

(…)

III – mudança de partido efetuada
durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em
lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do
mandato vigente.

Artigo Original em Dizer o Direito

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