ENTENDENDO O ART. 12-C DA LEI MARIA DA PENHA

A Lei nº 13.827/2019 alterou a
Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) para autorizar, em algumas hipóteses, a
aplicação, pela autoridade policial, de medida protetiva de urgência em favor
da mulher.

Vamos entender o que mudou, mas,
antes, é importante fazer uma revisão geral sobre o tema.

 

1. NOÇÕES GERAIS SOBRE AS MEDIDAS
PROTETIVAS DE URGÊNCIA

“Lei Maria da Penha”

A Lei nº 11.340/2006 (Lei de
Violência Doméstica) é conhecida como “Lei Maria da Penha”, em uma homenagem à
Sra. Maria da Penha Maia Fernandes que, durante anos, foi vítima de violência
doméstica e lutou bastante para a aprovação deste diploma.

A Lei nº 11.340/2006 prevê regras
processuais instituídas para proteger a mulher vítima de violência doméstica.

Desse modo, se uma mulher for
vítima de violência doméstica e familiar, a apuração deste delito (crime ou
contravenção penal) deverá obedecer ao rito da Lei Maria da Penha e, de forma
subsidiária, ao CPP e às demais leis processuais penais, naquilo que não for
incompatível (art. 13).

 

Medidas protetivas de urgência

Medidas protetivas de urgência
são providências previstas nos arts. 22 a 24 da Lei nº 11.340/2006 e aplicadas
para proteger as mulheres vítimas de violência doméstica.

 

Natureza jurídica

As medidas protetivas possuem a
natureza jurídica de medidas cautelares.

 

Pressupostos

Para a concessão das medidas
protetivas de urgência, é necessária a comprovação do:

a) fumus commissi delicti: é a demonstração da existência de indícios
de que houve violência doméstica contra a mulher.

b) periculum libertatis: é a existência de um risco à vítima ou a
terceiros caso a medida protetiva não seja imediatamente concedida.

 

Hipóteses previstas na Lei

 

Art. 22. Constatada a prática de
violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz
poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as
seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:

I – suspensão da posse ou restrição do
porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº
10.826, de 22 de dezembro de 2003;

II – afastamento do lar, domicílio ou
local de convivência com a ofendida;

III – proibição de determinadas
condutas, entre as quais:

a) aproximação da ofendida, de seus
familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes
e o agressor;

b) contato com a ofendida, seus
familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;

c) freqüentação de determinados lugares
a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;

IV – restrição ou suspensão de visitas
aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou
serviço similar;

V – prestação de alimentos provisionais
ou provisórios.

VI – comparecimento do agressor a
programas de recuperação e reeducação; e        
(Incluído pela Lei nº 13.984, de 2020)

VII – acompanhamento psicossocial do
agressor, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio.       (Incluído pela Lei nº 13.984, de 2020)

 

§ 1º As medidas referidas neste artigo
não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que
a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência
ser comunicada ao Ministério Público.

§ 2º Na hipótese de aplicação do inciso
I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do
art. 6º da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao
respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência
concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior
imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob
pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o
caso.

§ 3º Para garantir a efetividade das
medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento,
auxílio da força policial.

§ 4º Aplica-se às hipóteses previstas
neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5º e 6º do art. 461
da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil).

 

Art. 23. Poderá o juiz, quando
necessário, sem prejuízo de outras medidas:

I – encaminhar a ofendida e seus
dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;

II – determinar a recondução da
ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do
agressor;

III – determinar o afastamento da
ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos
e alimentos;

IV – determinar a separação de corpos.

V – determinar a matrícula dos dependentes
da ofendida em instituição de educação básica mais próxima do seu domicílio, ou
a transferência deles para essa instituição, independentemente da existência de
vaga.            (Incluído pela Lei nº
13.882,  de 2019)

 

Art. 24. Para a proteção patrimonial
dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de propriedade particular da mulher,
o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras:

I – restituição de bens indevidamente
subtraídos pelo agressor à ofendida;

II – proibição temporária para a
celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em
comum, salvo expressa autorização judicial;

III – suspensão das procurações
conferidas pela ofendida ao agressor;

IV – prestação de caução provisória,
mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática
de violência doméstica e familiar contra a ofendida.

Parágrafo único. Deverá o juiz oficiar
ao cartório competente para os fins previstos nos incisos II e III deste artigo

 

Rol exemplificativo

Vale ressaltar que o rol das
medidas protetivas previsto na lei é meramente exemplificativo, podendo ser
concedidas outras providências que não estejam ali elencadas.

Trata-se daquilo que a doutrina
denominou de princípio da atipicidade das medidas protetivas de urgência (LIMA,
Renato Brasileiro de. Legislação criminal
especial comentada.
4ª ed., Salvador: Juspodivm, 2016, p. 931).

 

Possibilidade de aplicação de
mais de uma

As medidas protetivas de urgência
poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente. Ex: determinação para que o
agressor se afaste do lar (inciso II do art. 22) e não se aproxime da vítima
(inciso III do mesmo artigo).

Além disso, as medidas protetivas
de urgência poderão ser aplicadas em conjunto com as medidas cautelares do CPP.
Ex: determinação para que o agressor se afaste do lar (inciso II do art. 22 da
LMP) e que compareça periodicamente em juízo (inciso I do art. 319 do CPP).

 

Momento

As medidas cautelares poderão ser
requeridas e deferidas durante a investigação preliminar e também após a
instauração do processo penal.

 

Legitimidade para requerer

Segundo o § 3º do art. 19 da Lei
nº 11.340/2006, as medidas protetivas de urgência podem ser requeridas:

a) a pedido da ofendida;

b) a requerimento do Ministério
Público.

 

Obs: o pedido da ofendida para
que lhe seja concedida medida protetiva não precisa ser subscrito por advogado
ou Defensor Público (art. 27 da Lei nº 11.340/2006).

 

E o Delegado de Polícia?

Não existe previsão na Lei para
que o Delegado, em nome próprio, formule pedido de concessão de medida
protetiva de urgência.

O que a Lei prevê é que a vítima,
ao ser ouvida pela autoridade policial, e ao ser cientificada de seus direitos,
declare que está solicitando a concessão de uma ou mais medidas protetivas.

Esse pedido da vítima é remetido
pelo Delegado para ser analisado pelo juiz.

Veja a dicção da Lei:

Art. 12.  Em todos os casos de violência doméstica e
familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade
policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles
previstos no Código de Processo Penal:

(…)

III – remeter, no prazo de 48 (quarenta
e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a
concessão de medidas protetivas de urgência;

 

Art. 18. Recebido o expediente com o
pedido da ofendida (pedido tratado no
inciso III do art. 12 acima)
, caberá ao juiz, no prazo de 48 (quarenta e
oito) horas:

I – conhecer do expediente e do pedido
e decidir sobre as medidas protetivas de urgência;

II – determinar o encaminhamento da
ofendida ao órgão de assistência judiciária, quando for o caso;

III – comunicar ao Ministério Público
para que adote as providências cabíveis.

 

Desse modo, em sentido
estritamente técnico, o Delegado de Polícia não formula, em nome próprio,
requerimento de concessão de medida protetiva. Ele remete ao juiz o pedido
deduzido pela ofendida.

Obviamente que isso não diminui
em nada a relevância da autoridade policial, que é o agente mais importante no
sistema de proteção da vítima de violência doméstica, sendo o que primeiro
ampara e garante os direitos da ofendida. O objetivo aqui é apenas ressaltar um
aspecto técnico-jurídico da Lei.

 

Medida protetiva concedida apenas
com base na palavra da vítima

O STJ já reconheceu como válida a
concessão de medida protetiva do art. 22, III, da Lei nº 11.340/2006 apenas com
base na palavra da vítima:

(…) 1. Em se tratando de casos de
violência doméstica em âmbito familiar contra a mulher, a palavra da vítima
ganha especial relevo para o deferimento de medida protetiva de urgência,
porquanto tais delitos são praticados, em regra, na esfera da convivência
íntima e em situação de vulnerabilidade, sem que sejam presenciados por outras
pessoas.

2. No caso, verifica-se que as medidas
impostas foram somente para manter o dito agressor afastado da ofendida, de
seus familiares e de eventuais testemunhas, restringindo apenas em menor grau a
sua liberdade.

3. Estando em conflito, de um lado, a
preservação da integridade física da vítima e, de outro, a liberdade irrestrita
do suposto ofensor, atende aos mandamentos da proporcionalidade e razoabilidade
a decisão que restringe moderadamente o direito de ir e vir do último. (…)

STJ. 6ª Turma. RHC 34.035/AL, Rel.
Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 05/11/2013.

 

Quais as consequências caso o indivíduo
descumpra a decisão judicial que impôs a medida protetiva de urgência?

• é possível a execução da multa
imposta;

• é possível a decretação de sua prisão
preventiva (art. 313, III, do CPP);

• o
agente responderá pelo crime do art. 24-A da Lei nº 11.340/2006:

Art. 24-A. Descumprir decisão judicial
que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei:

Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2
(dois) anos.

 

2. COMPETÊNCIA PARA A CONCESSÃO DA MEDIDA
PROTETIVA DE URGÊNCIA

Vamos agora tratar sobre o tema
realmente alterado pela Lei nº 13.827/2019: quem concede a medida protetiva de
urgência?

Em regra, a autoridade judicial
(Juiz ou Desembargador).

Até a edição da Lei nº
13.827/2019, essa regra não tinha exceções.

A Lei nº 13.827/2019 trouxe uma
exceção, permitindo que a medida protetiva de afastamento do lar seja concedida
pelo Delegado de Polícia se o Município não for sede de comarca ou até mesmo
pelo policial caso também não haja Delegado de Polícia no momento.

 

Entendendo a novidade
legislativa:

Verificada a existência de…

– risco atual ou iminente à vida
ou à integridade física da mulher em situação de violência doméstica e
familiar,

– ou de seus dependentes,

– o agressor deverá ser
imediatamente afastado do lar, domicílio ou local de convivência com a
ofendida.

 

Quem determina esse afastamento?

1º) em primeiro lugar, a
autoridade judicial.

2º) se o Município não for sede
de comarca: o Delegado de Polícia poderá determinar essa medida.

3º) se o Município não for sede
de comarca e não houver Delegado disponível no momento: o próprio policial
(civil ou militar) poderá ordenar o afastamento.

Se a medida for concedida por
Delegado ou por policial (situações 2 e 3), o Juiz será comunicado no prazo
máximo de 24 horas e decidirá, em igual prazo, sobre a manutenção ou a
revogação da medida aplicada, devendo dar ciência ao Ministério Público
concomitantemente.

Veja o dispositivo inserido:

Art. 12-C. Verificada a existência de risco atual ou iminente à
vida ou à integridade física da mulher em situação de violência doméstica e
familiar, ou de seus dependentes, o agressor será imediatamente afastado do
lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida:

I – pela autoridade judicial;

II – pelo delegado de polícia, quando o Município não for sede de
comarca; ou

III – pelo policial, quando o Município não for sede de comarca e
não houver delegado disponível no momento da denúncia.

§ 1º Nas hipóteses dos incisos II e III do caput deste artigo, o
juiz será comunicado no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas e decidirá,
em igual prazo, sobre a manutenção ou a revogação da medida aplicada, devendo
dar ciência ao Ministério Público concomitantemente.

(…)

 

Qual é o instrumento cabível
contra a decisão da autoridade policial que concede ou nega a medida cautelar
de urgência?

Se o juiz já manteve a decisão do
Delegado, o responsável pela decisão passou a ser a autoridade judicial e,
portanto, o recurso deverá ser contra o pronunciamento do magistrado.

Por outro lado, se o juiz ainda
não apreciou a decisão do Delegado, teremos duas situações possíveis:

• Delegado concedeu a medida: o
suposto ofensor pode impetrar habeas corpus para o juiz.

• Delegado denegou a medida: a
vítima deverá formular novo pedido de concessão da medida, agora para o juiz.

 

Quais as consequências caso o indivíduo
descumpra a decisão da autoridade policial que impôs a medida protetiva de urgência?

É possível que o Delegado represente ao
juiz para a decretação da prisão preventiva do ofensor (art. 313, III, do CPP).

Vale ressaltar que o agente não
responderá pelo crime do art. 24-A da Lei nº 11.340/2006, considerando que o
tipo penal fala em “descumprir decisão judicial”:

Art. 24-A. Descumprir decisão judicial
que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei:

Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2
(dois) anos.

 

Assim, o agente só responderá
pelo crime do art. 24-A se o juiz mantiver a decisão concessiva do Delegado e o
agressor continuar descumprindo a medida.

 

O agente poderia responder por
desobediência (art. 330 do CP)?

Também não.

Não há crime de desobediência
quando a pessoa desatende a ordem e existe alguma lei prevendo uma sanção
civil, administrativa ou processual penal para esse descumprimento, sem
ressalvar que poderá haver também a sanção criminal.

 

Explicando melhor:

• Se uma ordem é dada e na Lei
existe a previsão de uma sanção civil ou administrativa para o caso de
descumprimento dessa ordem, não se configura o crime de desobediência.

• Exceção: haverá delito de
desobediência se na Lei, além da sanção civil ou administrativa, expressamente
constar uma ressalva de que não se exclui a sanção penal.

Ex.1: Marcelo foi parado em uma
blitz. O agente de trânsito determinou que ele apresentasse a habilitação e o
documento do veículo, tendo Marcelo se recusado a fazê-lo. Marcelo não
cometeu crime de desobediência porque o art. 238 do Código de Trânsito já prevê
punições administrativas para essa conduta (infração gravíssima, multa e
apreensão do veículo), sem ressalvar a possibilidade de aplicação de sanção
penal.

Ex.2: Gutemberg foi intimado
para testemunhar em uma ação penal, tendo, no entanto, sem justificativa,
deixado de comparecer ao ato processual. Gutemberg cometeu o crime de
desobediência. O CPP determina que o juiz poderá aplicar multa e condená-lo a
pagar as custas da diligência, sem prejuízo do processo penal por crime de desobediência (art. 219).
Assim, a Lei (no caso, o CPP) prevê punições civis, ressalvando, no entanto,
que elas poderão ser aplicadas juntamente com a condenação criminal.

Ex.3: Cleôncio foi intimado
para testemunhar em uma ação de indenização por danos morais, tendo, no
entanto, sem justificativa, deixado de comparecer ao ato processual. Cleôncio não
cometeu o crime de desobediência. O CPC prevê que a testemunha faltosa será
conduzida coercitivamente e condenada a pagar as despesas do adiamento do ato
(art. 455, § 5º). Contudo, a Lei (no caso, o CPC) não prevê a possibilidade de
tais sanções cíveis serem aplicadas juntamente com a punição pelo crime de
desobediência.

E no caso do art. 12-C da Lei
Maria da Penha?

A Lei nº 11.340/2006 prevê que o
descumprimento da medida protetiva do art. 12-C gera uma consequência
processual penal (prisão preventiva) e não ressalvava a possibilidade de o
agente responder também criminalmente. Logo, seguindo o raciocínio acima, não
se pode condenar o agente por crime de desobediência.

Nesse sentido:

(…) 1. O Superior Tribunal de
Justiça firmou o entendimento de que para a caracterização do crime de
desobediência não é suficiente o simples descumprimento de decisão judicial,
sendo necessário que não exista previsão de sanção específica.

2. A Lei n. 11.340/06 determina que,
havendo descumprimento das medidas protetivas de urgência, é possível a
requisição de força policial, a imposição de multas, entre outras sanções, não
havendo ressalva expressa no sentido da aplicação cumulativa do art. 330 do
Código Penal.

3. Ademais, há previsão no art. 313,
III, do Código de Processo Penal, quanto à admissão da prisão preventiva para
garantir a execução de medidas protetivas de urgência nas hipóteses em que o
delito envolver violência doméstica.

4. Em respeito ao princípio da
intervenção mínima, não há que se falar em tipicidade da conduta atribuída ao
recorrido, na linha dos precedentes deste Sodalício. (…)

STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1528271/DF,
Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 13/10/2015.

 

ADI

A Associação de Magistrados do
Brasil (AMB) ajuizou ADI questionando a alteração promovida na Lei Maria da
Penha (Lei nº 11.340/2006) pela Lei nº 13.827/2019, a qual permite que, em
casos excepcionais, a autoridade policial afaste o suposto agressor do
domicílio ou do lugar de convivência quando for verificado risco à vida ou à
integridade da mulher, mesmo sem autorização judicial prévia (art. 12-C, II,
III e § 1º).

A autora da ação afirmou que, sem
que haja flagrante delito, a entrada de um policial sem autorização judicial em
qualquer domicílio viola princípios constitucionais da reserva de jurisdição,
do devido processo legal e da inviolabilidade do domicílio (incisos XII, LIV e
XI do artigo 5º da Constituição Federal).

No mesmo sentido, o
procurador-geral da República sustentou que o afastamento provisório do
agressor do lar é uma medida cautelar e, por esse motivo, só pode ocorrer com
autorização prévia do Judiciário.

 

Esses argumentos foram acolhidos
pelo STF? Essa previsão é inconstitucional?

NÃO. O STF decidiu que:

É válida a atuação supletiva e excepcional de
delegados de polícia e de policiais a fim de afastar o agressor do lar,
domicílio ou local de convivência com a ofendida, quando constatado risco atual
ou iminente à vida ou à integridade da mulher em situação de violência
doméstica e familiar, ou de seus dependentes, conforme o art. 12-C inserido na
Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha).

STF.
Plenário. ADI 6138/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 23/3/2022
(Info 1048).

 

A inclusão dos dispositivos
questionados na Lei Maria da Penha — art. 12-C, II, III e § 1º — é razoável,
proporcional e adequada. Ela permite a retirada imediata do algoz, sem ordem
judicial prévia, mediante a atuação de delegados de polícia, quando o município
não for sede de comarca, e de policiais, quando o município não for sede de
comarca e não houver delegado disponível no momento da denúncia. Em ambos os
casos, o juiz deverá ser comunicado no prazo máximo de 24 horas e decidirá
sobre a manutenção ou revogação da medida protetiva de urgência.

O afastamento ocorre de forma
excepcional, supletiva e ad referendum
do magistrado. Esse importante mecanismo visa garantir a efetividade da
retirada do agressor e inibir a violência no âmbito das relações domésticas e
familiares.

Ademais, a opção do legislador
não contraria a cláusula da inviolabilidade de domicílio, tampouco ofende o
devido processo legal (art. 5º, XI e LIV, da CF/88). As mudanças estão em
consonância com o texto constitucional, que não exige ordem judicial prévia
para o afastamento, bem como determina a criação de mecanismos para coibir a
violência no âmbito das relações familiares (art. 226, § 8º).

Além disso, a legislação está de
acordo com o sistema internacional de proteção aos direitos humanos das
mulheres e de combate à violência contra a mulher, que evoluiu no sentido de
recomendar a criação de mecanismos preventivos e repressivos eficazes e, dentre
outras considerações, a outorga de prioridade à segurança sobre os direitos de
propriedade.

Com esses entendimentos, o
Plenário julgou improcedente pedido formulado em ação direta e declarou a
constitucionalidade das normas impugnadas.

Artigo Original em Dizer o Direito

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