Em abril de 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a pretensão de reparação civil (por danos morais ou materiais) em razão de danos ambientais não está sujeita à prescrição. A decisão foi tomada no Recurso Extraordinário (RE) 654833, com repercussão geral (Tema 999). Embora não haja previsão constitucional ou legal sobre o prazo prescricional nesses casos, a Constituição Federal protege expressamente o meio ambiente, prevendo sua proteção e reparação, o que torna o direito à indenização imprescritível.

Extração ilegal de madeira

O recurso foi apresentado pela empresa Marmud Cameli e pelo espólio do ex-governador do Acre, Orleir Cameli, condenados à reparação de danos materiais, morais e ambientais decorrentes de invasões para extrair ilegalmente madeira de alto valor de mercado (mogno, cedro e cerejeira) em área indígena ocupada pela comunidade Ashaninka-Kampa do Rio Amônia (AC). As retiradas ilegais ocorreram entre 1981 e 1987.

A indenização fixada em primeira instância foi de aproximadamente R$ 1,5 milhão por danos materiais, R$ 3 milhões por danos morais em favor da comunidade indígena e mais R$ 5,9 milhões para custear a recomposição ambiental, a serem repassados ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos.

Fatos anteriores à Constituição de 1988

Ao questionar decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que havia mantido a condenação, a empresa alegou que deveria ter sido aplicado o prazo prescricional de cinco anos previsto na Lei da Ação Popular (Lei 4.717/1965), pois os fatos eram anteriores à Constituição Federal de 1988. Alternativamente, pediu que apenas a reparação do dano ao meio ambiente fosse considerada imprescritível.

Benefício à coletividade

Em seu voto, o relator do recurso, ministro Alexandre de Moraes observou que o tema em discussão é se, diante da inércia do poder público, deveria prevalecer o princípio da segurança jurídica, benéfico apenas ao autor do dano ambiental, ou os princípios constitucionais de proteção, preservação e reparação do meio ambiente, que beneficiam toda a coletividade. A seu ver, a existência de direitos fundamentais individuais não afeta a supremacia do interesse público em relação à conservação de um meio ambiente ecologicamente equilibrado e sadio.

Patrimônio comum da humanidade

Para o relator, o meio ambiente deve ser considerado patrimônio comum de toda a humanidade. Assim, todas as condutas do poder público devem ser direcionadas para a integral proteção legislativa interna e a adesão aos pactos e tratados internacionais protetivos, para evitar prejuízo da coletividade decorrente do uso de um recurso natural para finalidade individual.

Atuação protetiva

O ministro observou que, embora não haja previsão constitucional ou legal sobre o prazo prescricional para a reparação de danos civis ambientais, o fato de a Constituição Federal expressamente proteger o meio ambiente torna o direito à indenização, nesses casos, imprescritível. Ele também afastou a aplicação do prazo de cinco anos em razão de os danos terem ocorrido antes da Constituição de 1988, pois, antes disso, a legislação brasileira e os protocolos internacionais já protegiam o meio ambiente e previam a obrigação de o poluidor reparar os danos causados.

Negativa de direitos

O ministro Alexandre destacou o longo tempo decorrido sem que as vítimas, indígenas da comunidade Ashaninka-Kampa, tivessem a recomposição de seu patrimônio material e moral. “Adotar a tese da prescritibilidade seria o mesmo que lhes negar o direito fundamental e indisponível à vida, ou, como quis a Constituição, à saudável qualidade de vida”, afirmou.

A decisão permitiu a resolução de cerca de 2,5 mil casos que estavam sobrestados na época, e a tese fixada deverá ser obrigatoriamente aplicada a todos os casos semelhantes.

PR//CF

Leia mais:

4/6/2018 – Prescrição de ressarcimento de dano ambiental é tema de repercussão geral

Com informações do STF

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