Constitucionalismo digital foi o tema da palestra do ministro Gilmar Mendes no projeto SAE Talks – Ideias que aprimoram o Supremo, realizada nesta quarta-feira (27), no Supremo Tribunal Federal (STF). No evento, aberto ao público com transmissão pela internet, o ministro destacou a necessidade de estar atento às atualizações tecnológicas cada vez mais rápidas e, diante desse cenário, tomar consciência da importância de proteção, que é vital à própria ideia de cidadania.

Mendes ressaltou que o uso da internet pode afetar a capacidade decisória de um povo e lembrou o caso da Cambridge Analyctica, empresa de marketing político que obteve dados de testes psicológicos de usuários do Facebook e, com base nessas informações, atuou para influenciar a eleição presidencial que elegeu Donald Trump nos Estados Unidos e o plebiscito que decidiu a saída do Reino Unido da União Europeia (Brexit). “Se isso tem efeito em eleições nacionais, que dirá em eleições locais”, afirmou.

O ministro lembrou que os usuários da internet deixam rastros que permitem que “a vida seja aberta e devassada”. Ele considera necessário discutir essa temática com profundidade e responsabilidade e pensar, além dos casos concretos, nos mecanismos de monitoramento, utilizados tanto no âmbito de investigações criminais como na seara privada.

Outro ponto relevante é a forma de lidar com as grandes empresas de tecnologia, refletindo, por exemplo, em que casos seria possível proibir a divulgação prévia de conteúdo e como responsabilizá-las. “Proibir a divulgação de determinado tipo de matéria não seria censura, até mesmo censura prévia? Somos um país que teve que superar a censura”, ponderou.

O decano destacou que a Constituição de 1988 previu o habeas data como uma proteção de dados do indivíduo perante o Estado, e o instituto, em tese, não seria aplicável a relações privadas. Contudo, muitas vezes é necessário aplicar a eficácia horizontal aos direitos fundamentais para reconhecer os direitos dos indivíduos frente a entes poderosos, como Google, Facebook e Amazon.

Em relação ao Supremo, o ministro lembrou que, em plena pandemia da covid-19, surgiram debates sobre a privacidade de dados, como as ações diretas de inconstitucionalidade contra a Medida Provisória (MP) 954/2020, que prevê o compartilhamento de dados de usuários por prestadoras de serviços de telecomunicações com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Outro ponto que deverá ser enfrentado pelo STF é a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), que estabelece as hipóteses em que o provedor poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros. Ele observou que, no campo infraconstitucional, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que os responsáveis por conteúdo de terceiros não podem fazer censura prévia e devem remover conteúdo ilegal assim que notificados, além de manter meios de identificação de usuários.

O ministro considera importante reconhecer que a vida atual não seria possível sem a internet, que possibilitou ao próprio Supremo, por exemplo, manter seu funcionamento durante a pandemia. “É fundamental que estejamos todos abertos a essas possibilidades e a discutir novas abordagens”, concluiu.

Evento

O SAE Talks – Ideias que aprimoram o Supremo é promovido pela Secretaria de Altos Estudos, Pesquisas e Gestão da Informação (SAE) do STF. Periodicamente, são realizados workshops, seminários e eventos temáticos para intercâmbio de experiências e produção de conhecimento.

PR/AD

Leia mais:

Artigo: “Constitucionalismo digital e jurisdição constitucional: uma agenda de pesquisa para o caso brasileiro“, do ministro Gilmar Mendes e de Victor Oliveira Fernandes
 

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Fonte STF

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