Imagine a seguinte situação
hipotética:

Os fiscais da Agência Nacional de
Telecomunicações (ANATEL) constataram que João mantinha um provedor de
internet, via rádio, no qual os clientes pagavam a ele mensalmente e recebiam
em suas casas o sinal da internet.

Ocorre que João não tinha
autorização da ANATEL para exploração desse serviço.

Foi, então, lavrado auto de
infração e encaminhada notícia do fato ao MPF.

O Procurador da República
denunciou João pela prática do delito do art. 183 da Lei nº 9.472/97:

Art. 183. Desenvolver
clandestinamente atividades de telecomunicação:

Pena – detenção de dois
a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, e multa de R$
10.000,00 (dez mil reais).

Segundo a tese do MPF,
o provedor de acesso à Internet via radiofrequência (internet via rádio)
desenvolve dois serviços:

• um serviço de
telecomunicações (Serviço de Comunicação Multimídia); e

• um Serviço de Valor
Adicionado (Serviço de Conexão à Internet).

Dessa
forma, a chamada “internet via rádio” pode ser considerada também um serviço de
telecomunicação.

A jurisprudência acolhe a tese do MP? A conduta de
transmitir sinal de internet, via rádio, como se fosse um provedor de internet,
sem autorização da ANATEL, configura algum crime? Amolda-se ao art. 183 da Lei nº
9.472/97?

STJ: SIM

STF: NÃO

É
pacífico no STJ que a transmissão clandestina de sinal de internet, via
radiofrequência, sem autorização da ANATEL, caracteriza, em tese, o delito
previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97.

Não
há se falar em atipicidade do delito pela previsão de que se trata de serviço
de valor adicionado, uma vez que referida característica não exclui sua
natureza de efetivo serviço de telecomunicação.

STJ.
5ª Turma. AgRg no AREsp 1077499/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado
em 26/09/2017.

STJ.
6ª Turma. AgRg no AREsp 971.115/PA, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado
em 27/04/2017.

A
oferta de serviço de internet é concebida como serviço de valor adicionado e,
portanto, não pode ser considerada como atividade clandestina de
telecomunicações, não caracterizando o crime do art. 183 da Lei nº 9.472/97.

O
serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicação,
classificando-se o provedor como usuário do serviço que lhe dá suporte, com
os direitos e deveres inerentes a essa condição.

A
Lei nº 9.472/97 previu, em seu art. 60, o que são “serviços de
telecomunicações” e, em seu art. 61 trouxe a definição de “serviço de valor adicionado”,
sendo, portanto, conceitos distintos.

STF.
1ª Turma. HC 127978, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 24/10/2017 (Info
883).

Ressalte-se que houve
uma mudança de posição do STF que, anteriormente, também entendia ser crime. Nesse
sentido: STF. 1ª Turma. HC 129807 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em
31/03/2017.

Artigo Original em Dizer o Direito

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