Imagine a seguinte situação hipotética:

João, 71 anos de idade, decidiu se
casar com Andressa.

Dez anos depois, Andressa pediu o
divórcio.

Andressa pediu a partilha dos bens
adquiridos onerosamente durante o casamento.

João
alegou que não tinha que dividir o patrimônio considerando que, quando o
casamento foi contraído, ele possuía mais de 70 anos de idade, de forma que o
regime patrimonial que regulou a relação dos dois foi o regime legal da separação obrigatória de bens, previsto no
art. 1.641, II, do Código Civil:

Art. 1.641.
É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:

I – das
pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração
do casamento;

II – da
pessoa maior de 70 (setenta) anos;

III – de
todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.

Ao maior de 70 anos é imposto o regime
de separação obrigatória de bens. O objetivo do legislador foi o de proteger o
idoso e seus herdeiros de casamentos realizados por interesse estritamente
econômico.

Trata-se de “prudência legislativa em
favor das pessoas e de suas famílias, considerando a idade dos nubentes. É de
lembrar que, conforme os anos passam, a idade avançada acarreta maiores
carências afetivas e, portanto, maiores riscos corre aquele que tem mais de
setenta anos de sujeitar-se a um casamento em que o outro nubente tenha em
vista somente vantagens financeiras, ou seja, em que os atrativos matrimoniais
sejam pautados em fortuna e não no afeto” (MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito de família.
São Paulo: Saraiva, 2012, p. 295).

Nomenclatura

O art. 1.641 trata sobre a separação
obrigatória de bens (também chamada de separação legal de bens).

Havendo dissolução de casamento que era
regulado pelo regime da separação obrigatória de bens (art. 1.641, II, do CC),
como deve ser feita a partilha dos bens?

Deverão ser partilhados apenas os bens
adquiridos onerosamente na constância da união estável, e desde que comprovado
o esforço comum na sua aquisição.

Desse
modo, em nosso exemplo, Andressa terá direito à meação dos bens adquiridos
durante o casamento, desde que comprovado o
esforço comum
. Esse é o entendimento pacificado do STJ:

No regime de separação legal de bens, comunicam-se os
adquiridos na constância do casamento, desde que comprovado o esforço comum
para sua aquisição. 

STJ. 2ª
Seção. EREsp 1.623.858-MG, Rel. Min. Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado
do TRF 5ª Região), julgado em 23/05/2018 (Info 628).

Esse “esforço comum”
pode ser presumido?

NÃO. O esforço comum
deve ser comprovado.

Quando o STJ fala
“desde que comprovado o esforço comum”, ele está dizendo que não se pode
presumir. Deve ser provado pelo cônjuge supostamente prejudicado.

Se houvesse presunção
do esforço comum o regime da separação obrigatória não existiria na prática

Se fosse adotada a
ideia de que o esforço comum deve ser presumido isso levaria à ineficácia do
regime da separação obrigatória (ou legal) de bens, pois, para afastar a
presunção, o interessado teria que fazer prova negativa, comprovar que o
ex-cônjuge ou ex-companheiro em nada contribuiu para a aquisição onerosa de
determinado bem. Isso faria com que fosse praticamente impossível a separação
dos aquestos.

A exigência de
comprovação do esforço comum é mais consentânea com os fins da separação legal

O entendimento de que
a comunhão dos bens adquiridos pode ocorrer, desde que comprovado o esforço
comum, parece mais consentânea com o sistema legal de regime de bens do
casamento, recentemente adotado no Código Civil de 2002, pois prestigia a eficácia
do regime de separação legal de bens.

Caberá ao interessado
comprovar que teve efetiva e relevante (ainda que não financeira) participação
no esforço para aquisição onerosa de determinado bem a ser partilhado com a
dissolução da união (prova positiva).

Súmula 377 do STF

O STF possui uma
súmula antiga sobre o tema (editada em 1964). Veja a redação do enunciado:

Súmula
377-STF: No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na
constância do casamento.

Essa súmula 377 do STF
permanece válida?

SIM. No entanto, ela
deve ser interpretada da seguinte forma:

“No regime de
separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”,
desde que comprovado o esforço comum para sua
aquisição
.

Nesse sentido: STJ. 4ª
Turma. REsp 1.689.152/SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,
julgado em 24/10/2017.

O que foi explicado
acima vale também para a união estável?

SIM. O STJ
possui alguns julgados afirmando que essas regras sobre separação legal devem
ser aplicadas também no caso de união estável. Nesse sentido: STJ. 4ª Turma.
REsp 646.259/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 22/06/2010.

Separação LEGAL (obrigatória) ≠ Separação ABSOLUTA

Separação LEGAL (OBRIGATÓRIA)

Separação ABSOLUTA

Separação LEGAL (obrigatória)
é a prevista no art. 1.641 do Código Civil.

Separação ABSOLUTA é a separação
convencional, ou seja, estipulada voluntariamente pelas partes (art. 1.687 do
CC).

No regime de separação legal
de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento, desde que
comprovado o esforço comum para sua aquisição. 

Na separação absoluta
(convencional), não há comunicação dos bens adquiridos na constância do casamento.

Assim, somente haverá
separação absoluta (incomunicável) na separação convencional.

Artigo Original em Dizer o Direito

Posts Similares

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.